GRUPO MELLO PALITA OS DENTES COM PORTUGAL

«O questionável apoio da CGD ao Grupo Mello, no âmbito da OPA lançada sobre a Brisa, permite discutir mais uma vez, entre outras questões, a promiscuidade entre os grandes grupos económicos e os poderes políticos. Lembro, a propósito, que quando a nova Administração do banco público foi nomeada, e não colocando em causa as qualificações ou a probidade pessoal dos escolhidos, me pareceu estranho, tendo disso dado nota pública, que alguns dos membros dessa Administração tivessem fortes ligações a esse grupo. Naturalmente que os interesses políticos e os interesses dos grandes grupos económicos interagem entre si. Não se pretenderá que se governe contra os grupos económicos, e é perfeitamente razoável que estes façam lobby a favor dos seus interesses. Já não é, todavia, lícito que se governe para esses grupos económicos, ou que exista uma excessiva permeabilidade entre eles e o poder político que lhes permita captar uma fatia desproporcionada dos recursos escassos do país. Infelizmente, e nos últimos 20 anos, o fraco crescimento da economia deveu-se ao endividamento externo e ao desenvolvimento dos sectores de bens e serviços não transacionáveis. Sectores esses que não estão sujeitos à concorrência externa, e que cresceram num mercado pequeno e muito imperfeito, sem concorrência ou regulação adequada. Tiveram, assim, campo livre para extorquirem tudo aquilo que precisavam da economia, aumentando os seus custos de contexto e prejudicando, dessa forma, a competitividade externa dos outros sectores da economia. Para perpetuarem a sua influência, para terem sempre uma palavra a dizer na governação e não sofrerem as consequências da rotatividade dos governos, criaram as suas brigadas de elite dentro dos partidos políticos. Dessa forma, fizeram negócios chorudos com o Estado, de que são melhor ou pior, exemplo as parcerias público-privadas, em que o Estado assumia todo o risco, mas pagava uma taxa de rentabilidade ao privado como se fosse este a assumir esse risco. Conseguiram, ainda, concorrer a privatizações com financiamentos desproporcionados, dando como única e fraca garantia as ações da empresa-alvo. Contaram, por fim, com inúmeros benefícios de ordem fiscal, e com incentivos ao investimento. Esta fórmula de negócio protegido tornou-se tão interessante que houve políticos que resolveram, então, replicá-lo, para seu benefício direto. Tinham chegado à política sem cheta, tinham ajudado alguns a acumular milhões, achavam que também tinham lugar à mesa. Foi essa, como se sabe, a história do BPN. Assim se acumularam fortunas, e apareceram novos capitalistas, enquanto o país definhava e se endividava. Agora, os tempos são diferentes. Faltam recursos, e há muita gente aflita. Está, por isso, na altura de acabar com esse vício. Para isso, deveria o Estado invocar a alteração anormal e imprevisível das circunstâncias para renegociar os negócios existentes com esses grupos económicos. Se se questiona, por razões de necessidade e emergência, os direitos adquiridos do cidadão comum, não se percebe por que razão os direitos adquiridos destes grupos económicos nesses negócios, permanecem inatacáveis. Para vencer essa batalha, é preciso haver coragem e descomprometimento. Infelizmente, são poucas as tropas disponíveis para tão árdua tarefa. Ora, quando os partidos políticos convergem entre si na estratégia puritana, inspirada pelos média e fomentada pela inveja, de remunerar mal os políticos e de acentuar novas incompatibilidades, estão a perpetuar este estado de coisas e a manter o poder subserviente perante os senhores do costume. Enquanto assim for, os recursos do país continuarão a ser mal repartidos. A economia não será planeada, como o foi no passado, quando havia condicionamento industrial, mas estará sujeita a este tipo de distorções uma vez que o sucesso das empresas dependerá não da qualidade do seu produto, ou da sua eficiência, mas da sua eficácia em se aproximar do poder. O país, esse, continuará cada vez mais desigual e cada vez mais pobre.» Rui Moreira

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