LUÍSA, A MATERNAL, E A SEVÍCIA NACIONAL

Ontem, já era tarde, o sono pesava, pude ver a brevíssima entrevista de José Gomes Ferreira à Ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque. O entrevistador esteve bem, como sempre, simpático, directo, capaz da pergunta incómoda. A Ministra mostrou-se leve, simpática, natural, directa, assertiva. Maternal. Gostei da pessoa e a pessoa passou bem, tanto mais que aquela mulher, trucidada e combatida ao longo do Verão pela culpa desculpista e UltraSwapista do PS, não é uma máquina de propaganda do PSD nem faz um discurso redondo. É só uma técnica, uma mãe, uma de nós. Como qualquer mãe, faz o que tem a fazer e fá-lo no máximo das suas capacidades. O Orçamento do Estado 2014 de que falou, já se sabe, é, se for, a derradeira mensagem aos credores, mensagem de boa-fé às instituições europeias, o abre-latas para todas as possibilidades imediatas no concerto do dinheiro mundial. Quando passar na AR e se prevalecer ao crivo obsolescente do Obsoleto Ratton, um conjunto de medidas aliviadoras e de carácter sistémico na e da Europa ficaria automaticamente em aberto e talvez a solidariedade inter-membros regresse, como deve, à União. Com o sucesso do nosso Resgate, é o Euro que está em causa. Ao contrário do que acontece na Alemanha, onde os partidos negoceiam e se coligam naturalmente para formar Governo, em Portugal o primitivismo reles e a bacorada do baixo interesse pontuam há décadas, fomentando uma compita e um exclusivismo que se têm revelado estéril e contraproducente. Hipócritas apontam o dedo a hipócritas e os dedos apontados dariam provavelmente, se entrelaçados, para urdir um cesto. Só assim se explica que, por exemplo, o PS não tenha interesse em transformar a Governação PSD-CDS-PP por dentro, mediante a lealdade negocial activa, a persuasão firme e acordos que salvaguardem os interesses nacionais, votando hipocritamente às cegas contra um documento que provavelmente seria compelido a desenhar se estivesse na governação; votando contra um documento desconhecido no momento mesmo do anúncio do voto contra. Só assim se explica que haja cartas antecipadamente marcadas nos demais partidos PCP, Verdes e Bloco de Esquerda, com a velha retórica de beco murado, sempre intransponível, onde tudo, no Governo, será sempre horroroso, nada explicável, nada digno de aplauso, combatível à partida. A Ministra garantiu que o corte nos salários e pensões é uma medida transitória, não precisando o trânsito temporal em que vigorará. O tempo concita de nós paciência e coragem, responsabilidade e honestidade intelectual, à luz da história exemplar e recente da Grécia: sempre que tergiversou, piorou o seu cenário. Espero do Presidente da República o respaldo ao documento que implicitamente já existia fantasmagoricamente nas suas intenções de um acordo de Regime aquando das negociações tripartidárias falhadas de Julho. O objectivo nacional não pode ter opostos e é, para já, apenas um: assegurar o êxodo da Troyka. Ponto. Aceder, assistidamente ou quase, aos mercados. Espero que o Tribunal Constitucional consistentemente o máximo de medidas que foram alvo de um expresso bloco fundamentador e nada mais fundamentador que a situação de extrema necessidade e absoluta vulnerabilidade do Estado Português para se financiar, começo de conversa para a saída do sufoco, base para o crescimento, regresso à reposição dos rendimentos guilhotinados. Tudo o que sejam medidas presidenciais e decisões rattonianas que empatem essa derradeira mensagem apaziguadora aos mercados em que este OE 2014 consiste, deve ser evitado a todo o transe como uma submissão do documento a uma fiscalização preventiva. Sempre que um Estado entra em falência, os Governos antes de se submeterem à vontade soberana dos seus Povos devem submeter-se aos critérios dos seus devedores. Isto é fatal. Depois de uma falência, os OE deixam de ser actos rotineiros revestidos de patética formalidade. São batalhas. Levamos já duas batalhas e meia por Portugal, 2011, 2012, 2013. A quarta é a decisiva. Agora, a execução orçamental da Mensagem Orçamental de 2014 necessita de estabilidade para que o Estado Português possa pelo menos aceder ao programa cautelar substitutivo do programa de resgate. Se há uma data crucial a ter em conta, Junho, tudo tem de correr pelo melhor. Sem atritos. Sem furibundices. Sem perdas de calma. Se raivas inúteis. Suportando o trabalho, quem o tiver. Suportando o desemprego, que nele estiver. Teremos de ter um Orçamento funcional em Janeiro. O primeiro trimestre será um tempo amargo, só feliz se representar a evacuação da Troyka; tempo do fim das avaliações trimestrais; fim do vexame da ingerência; fim do ditar de condições externas para obtermos financiamento. Sim, infelizmente, os credores têm de ser domados e convencidos e são Orçamentos corajosos, duros, com demasiado saque e superabundante confisco que os satisfazem. A figura serena, firme e maternal de Maria Luís passou ontem a mensagem crucial de inclusão sua no passo que daremos pela libertação formal e simbólica da intrusão internacional. Uma mãe. Uma mulher. É muito pouco plausível que uma mãe seja insensível e não faça estritamente o que tem de fazer. Cabe-nos armadilhar o País para que nunca uma geração de chupistas degenerados possa lançar Portugal de novo na sarjeta, na vergonha de nos não consentirmos boa governança nunca, vergonha de um escrutínio popular pobre, vergonha de uma elite comentadeira venal e pactuadora com decisões políticas-crimes a montante destas decisões-crime remediadoras, vergonha de uma massa flébil demagogizável, pasto de demagogos devastadores, como Sócrates, e manipuladores maldosos e desavergonhados, como Sua Impostura, Bardamérdio Soares. É uma pena que muitos encontrem um estranho consolo nas suas palavras sediciosas e anti-patrióticas: quero saber o que faria o PS com um motim geral instilado por Soares a estalar-lhes nas mãos e se acha que ficaria de fora da nossa ira? E que progressos práticos obteria o PCP se os extremistas infiltrados na que era-para-ser-Marcha-CGTP-na-Ponte-e-vai-espingardar-de-popó desembrulhassem a sua virulência?! Só há uma saída para o País, o pragmatismo. Temos de lidar com a realidade tal como ela se nos apresenta. A realidade é a do Euro. As exigências são as de um País falido a tentar reerguer-se, custe o que custar. Uma nota final acerca das greves: façam-nas. São justas. São um sinal, um dos poucos, da nossa pertença e coesividade comunitárias e um reagente, talvez o único, contra um estado de difusa opressão multiforme. São milhões os que trabalham de mais e vivem de menos. São milhões os que não têm trabalho e também não vivem com mais plenitude e a dignidade por que vale a pena estar vivo. Outros milhões são os que ou comem ou se medicam. Podem os Governos perseguir-nos, podem os mercados oprimir-nos, algures, ao nível do solo, ou aprendemos a ser concretamente solidários entre nós ou merecemos tratos e destratos muitíssimos piores.

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