VASSILI E ANATOLI


Vassili e Anatoli vieram aos poucos junto de mim a sentir
se lhes interessaria algum dia gastar algum do seu dinheiro, arduamente ganho
na construção civil, com a Noite do meu Pub,
noite onde pairo umas asas muito minhas,
tão inconformistas como compassivas,
tão rebeldes como pacíficas.
lkj
Vieram uma vez, fizeram-me perguntas,
eu fiz-lhes perguntas, espreitaram, mas não entraram.
Altos como estacas, quarentões eslavos,
magros, marcados pelo sol meridional, ficaram simplesmente ali,
da vez inicial, fumando, a olhar-me muito sorridentes e amistosos.
Depois, de repente, partiram. Simplesmente. Apertando-me muito as mãos
e amistosamente afagando as minhas costas e eu as deles, amistoso.
lkj
Tempos depois, semanas, meses, já não sei, voltaram.
Sentaram-se calmamente numa espécie de antecâmera gratuita com os seus cigarros acesos.
Perguntaram mais coisas, tiraram outras dúvidas. Conversámos, sorrimos,
convivemos, trocamos cumplicidades culturais fáceis sobre a Rússia, as famílias, as filhas,
tornámo-nos em fracção de nada companheiros. «O trabalha muito dura.»
Mas ainda não seria desta vez aquela em que finalmente entrariam.
lkj
Só entraram quando quiseram, quando mediram e pesaram todas as coisas,
dinheiro, consumos, ambiente, só entraram informados de tudo,
seguros do preço das coisas. Vieram. Cumpriram o mesmo ritual já descrito.
E então, sim. Franquearam finalmente aquela Porta que guardo.
E foi bonito ver de essa vez o Anatoli ainda mais feliz e realizado,
a dançar com várias portuguesas e o Vassili, o mais moreno, com menos sorte,
assistindo ao triunfo do amigo, saindo muitas vezes para fumar e de todas as vezes
olhando-me cúmplice e benevolente ao passar com a sorte do amigo e o vazio dele.
lkj
Num dia posterior, só veio o Vassili. Esteve por um tempo na paragem do Autocarro.
Solitário. Depois entrou. Esperou. Mais tarde, uma portuguesa cinquentina bem roliça
cabelo ondulado e grisalho, olhos claros, rosto muito suave e redondo,
muito tímida, vestida a preto, que nunca estivera ali e começa por me perguntar pelo WC,
entra também. Dança com Vassili toda a noite. Dançam e beijam e beijam e dançam.
Corpo colado ao corpo, o alto eslavo moreno, de olhos flamejantes e muito verdes,
com a sua portuguesa redondinha, de olhos claros, vestida de preto, mansa e suave.
lkj
Nunca esquecerei o rosto afogueado, absolutamente lúbrico,
o olhar brilhante, atarantado de prazer feliz com que, à saída,
a mulher, olhando-me, se cruzou comigo.
Todo o desejo e todo o prazer estavam naquele olhar, naquele suor,
no calor daquela portuguesa que bem passaria por boa mãe de família
e boa tia na sua aparência e vestuário típicos e convencionais
numa Apresentadora de programa televisivo de culinária nos anos 80.

Comments

antonio ganhão said…
Quem entra fica preso, sair é uma ilusão.
Tiago R Cardoso said…
tás lixado comigo, nem me respondes, deixa eu te apanhar a jeito...

Até lá, brilhante momento.
Pata Negra said…
Alguém tem alguma coisa contra o prazer?
Viva o prazer Joshua! Prazer em lê-lo!

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