DIÁLOGO DA SERIEDADE














- Ser sério, isso é o que falta ao senhor.
- Mas por que se exalta, que lhe fiz eu para pôr em causa a minha seriedade?
- O senhor não é sério nem coerente.
- Mas sério em quê? E coerente em quê?
- Então o senhor espalha impropérios nos seus posts medíocres
e depois escreve sublimemente sobre o Espírito Santo e acha isso normal?
- Acho normal que eu seja dono e senhor do que me apeteça escrever. O amigo não acha?
- Não acho que caibam no mesmo lugar as suas tretas obscenas e os seus devaneios religiosos. Isso fere a sensibilidade. Pelo menos a minha fere.
- Mas então o meu amigo não admite que a nossa alma seja incoerente, contraditória e inconstante, desassossegada na infelicidade e sôfrega por felicidade?
- Admito.
- Não me admite que o exprima conforme mo dita a mente?
- Admito-lho, mas custa ver a conjugação de tantos contrários
e por vezes uma linguagem brutal, baixa...
- Vá-se habituando ao vórtice do efeito provocatório da palavra que,
mesmo baixa, puxa para cima e não se compraz na baixeza.
- Isso é ser lírico.
- Isto é acreditar na ascensão da humanidade e na catabase da Cidade Celestial.
Não é fácil viver num mundo onde de um lado há laicos raivosos,
trucidando ideologicamente a pessoa por lhe verem somente a materialidade
e o respectivo lastro no ecossistema, gente para quem um embrião é já só tripa,
fáceis amígdalas, acessível adenóide,
e, por outro, os religiosos
que no seu proselitismo visam uniformizar a bem ou a mal as opções políticas e religiosas
dos povos do mundo, islamizar-nos pela bomba, pelo medo e pela demografia.
Nem é fácil criar literatura em tempo real, arriscando biografar uma frase que nada tem de biográfico...
- Compreendo...
- Não. Não compreende. Não há nada a compreender.
É, aliás, necessário que nada compreenda.
O amigo leve-me a sério. Leve-me muito a sério.

Comments

thorazine said…
A falta de livre-arbítrio espanta os laicos. Mas mesmo nos laicos, a maquinaria biológica que possibilita o livre-arbítrio está sujeita e limitada pelas leis físicas. Nomes, conceitos...tudo para tentarmos ser diferentes e definir grupos. :)

Quanto aos embriões...é verdade, a vida é sagrada (e isto pode ser entendido tanto de uma maneira religiosa ou laica)! MAs a "boa vida" é mais sagrada! Por muito que digam que o sofrimento tem de existir eu não quero compactuar com ele. Não quero responsabilizar-me. Uma criança, não sendo desejada, aliás, sendo repugnada, certamente poucas possibilidades vai ter de ser feliz. Pode até ser, mas numa sociedade de massas temos que jogas com probabilidades. Bastante gente se for forçada, legalmente, a ter o filho vai tê-lo, e com a "vergonha" (sentimento pobre na sociedade humana) vai recusar-se a da-lo para adopção e aguentar o "fardo". É a realidade; pelo menos a minha! Não acredito que um embrião de 10 semanas sofra, um conjunto de células - podem chamar-lhe ser humano ou não - que podem vir a ser algo mais complexo. O importante é que não sofre, não chega a sentir. Tal como uma pessoa sem qualquer actividade cerebral, não acredito haja sequer capacidades fisiológicas para existir "sentimentos" quanto mais "sentimentos consciêntes".

Não sinto compaixão por um embrião, é verdade! Mas senti pelo Saddam. Irónico, não?

Gosto bastante como escreves! :)

PS - Quanto à "linguagem" brutal concordo que não há nada que possa criar preocupações. O "big boss" nunca iria criar-nos com um cérebro destes para depois não o usarmos por inteiro, só os humanos é que criam uma panóplias de palavras para depois condenarem o seu uso social! ;))))

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