GASPAR, SWAPS E O PASSADO INTERDITO

Meu Deus, que País dualista, bizantinista, clivado, segundo o tal paleio que não faz acontecer. Isto, o ambiente do comentário e da politiquice, está de tal maneira maniqueu, que vale tudo, à força de insistência, para abater os incumbentes, herdeiros do Pedido de Resgate, mas poupar os agentes que fizeram trinta por uma linha e procrastinaram contas e riscos, como se não tivéssemos fatalmente de pagar todos os desmandos e optimismos. 

Vítor Gaspar, só para dar um pequeno exemplo de alguém que tem apanhado forte e feio por falhar metas e previsões sucessivas, não pode dizer o que quiser e achar por bem na matéria viscosa dos swaps. No caso desses contratos especulativos e do potencial buraco extra de 2,8 mil milhões de euros nas contas públicas, está impedido pelas drago, pelos medina e demais virgens vaginais do passado, de quaisquer acusações como o facto de os contratos swap serem consistentes com outros actos de gestão aventureira e que compõem um padrão nos Governos de José Sócrates. Meu Deus, isso não.

Logo os tweetistas do Fascismo de Esquerda-na-Garganta e Croquetes-no-Bucho, os galambas, os jugulares, os valupis, os bicicleta, os corporativescos, toda a fauna que se locupletou directamente com o facto de ser muito competente a dourar a grande peta socialista, vêm rasgar as vestes. Não se pode! Não se pode. Pode atirar-se a matar sobre Cavaco, pode rebaixar-se à vontade os passos, os relvas, toda a outra fauna dita de Direita que, para todos os efeitos, carrega o fardo de governar a precária naviarra nacional hoje, mas não se pode apontar o dedo ao Passado. 

Por isso, quando Gaspar ousa dizer que a estrumeira dos swaps «é um padrão de comportamento sistemático por parte da gestão do Partido Socialista», e ousa dizê-lo na comissão parlamentar de Orçamento, Finanças e Administração Pública, e ousa dizê-lo ao lado da secretária de Estado do Tesouro, Maria Luís Albuquerque, isso é toda uma ruptura com as prudenciais lealdades no Regime e que passam, como bem sabemos, pelo perpétuo armistício tácito entre o PS e o PSD, com o qual-armistício se minimizam os danos na Opinião Pública relativos às respectivas malfeitorias, experimentalismos patetas e outros desastres gestionários. Gaspar aponta o dedo ao Passado e é todo um fim do mundo. Ele, o outsider, o insensível político, o burocrata, o teórico retalhista, não tinha o direito de o fazer em cima dos silêncios cúmplices que sempre irmanaram os grandes protegidos do Regime. 

Ora, precisamente as perdas potenciais nas empresas do sector empresarial do Estado com estes contratos especulativos, com a coragem e o vingança fria e oportuna de Gaspar, fazem-nos pensar apenas no próximo passo que o Bananal deveria dar. Criminalizar actos temerários de gestão que, na prática, significam gravíssimas amputações e decapitações no Estado Social, quer queiramos, quer não, ou o poder e a boa vontade não estivessem do lado dos credores. Se um desempregado, uma família de desempregados, uma vila de desempregados, uma cidade de desempregados, podem queixar-se em vão dos que abriram as portas à desgraça tanto quanto dos que a têm resolvido mal, continua a ser necessário muito mais que isso. É preciso isaltinar e vale-e-azevedar a Justiça, especialmente quando o escândalo é geral e vai recrudescer. Descobrir, aprofundar o conhecimento acerca, e depois gerir o dossiê dos swaps não pode ter sido fácil, mas ninguém desmentirá que os problemas «de natureza especulativa» são anteriores à entrada em função do actual Executivo: tal como nas PPP, «Verificou-se que muitos dos contratos analisados permitiram às empresas apresentar resultados mais positivos no curto prazo, à custa de assunção de riscos muito significativos no futuro». Não se fica adentrado numa pasta desta magnitude, num abrir e fechar de olhos, calcula-se, menos Drago que é taxativa por vício e feitio. Por isso mesmo, as críticas dos deputados do Partido Socialista deveriam ser, antes de mais, auto-críticas, coisa que os Congressos dos Beijos e Abraços, Túnica Inconsútil da Velha Conversa Masturbatória e Nefelibata dos Partidos, não sabem lavar e levar até às últimas consequências para que re-acreditemos nas boas intenções de quem se abalança para nos dar esperança. Relíquia delicada do legado socratesiano, o deputado socialista Fernando Medina é outro dos enfiaram a carapuça, caindo como patinhos: «não existem factos mas já existem criminosos e inocentes» … «É uma vergonha, é inaceitável que haja este jogo político», queixa-se ele da longa espada de Gaspar. Mas não é verdade. 

O jogo político habitual é o do esconde-esconde, da diluição de culpas, do fica-tudo-em-família. Esse é o Pântano de que Guterres quis evadir-se, o Pântano dos Varas e dos outros sempre vítimas de assassinato de carácter, sempre vítimas de campanhas negras, nunca chamados a explicar a prodigiosa prosperidade pessoal. Os Portugueses nunca são vítimas deles. Nunca há culpados. Até chegar, vindo de Marte, um Gaspar. Acredito que este homem de aço não precisa do Regime e dos Padrinhos e Eminências Pardas do Regime para absolutamente nada. Basta-lhe as costas quentes do BCE e dos demais Príncipes deste Mundo.

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