FESTAS DA BAMBOCHATA
«Quando o Governo de José Sócrates anunciou o projeto Parque Escolar, defendi que a remodelação das nossas escolas era um bom investimento público porque, ao contrário de outros, poderia resultar num claro benefício para a economia. Para além de poder reanimar o sector da construção civil, já então em crise muito profunda, a oferta a alunos e docentes de instalações com maior funcionalidade poderia ajudar à superação do atraso educativo português face aos padrões europeus.
A verdade, porém, é que logo que se conheceu o projecto em mais detalhe, se levantaram dúvidas sobre a sua implementação e se questionou, por isso, a relação entre custo e benefício. Uma boa ideia não resulta necessariamente num bom investimento e, neste caso, optara-se por escolher a dedo alguns dos arquitetos do regime e os concursos públicos foram feitos de forma a beneficiar algumas grandes empresas de construção civil em vez de se optar por adjudicações parcelares que teriam um maior impacto no sector. Houve, além disso, uma escolha pouco judiciosa e muitas vezes faraónica de materiais e de equipamentos sem tomar em conta a incorporação nacional, olvidaram-se as questões da sustentabilidade, e nomeadamente a importantíssima questão da eficiência energética. Por razões estéticas, recusaram-se, por exemplo, propostas de utilização de painéis solares que poderiam resultar em redução de custos e até numa receita para as escolas, na medida em que estão encerradas nos meses de verão, e poderiam então abastecer a rede eléctrica.
No inverno passado, visitei uma escola nos arredores do Porto, em que pude constatar que as soluções arquitetónicas que tinham sido adotadas eram esplêndidas do ponto de vista estético. Contudo o luxo contrastava com as condições objectivas de funcionamento. Lá dentro, estava um frio de morrer porque, segundo me informaram, os sistemas de climatização exigiam níveis de consumo de energia que não eram sustentáveis pelo orçamento da escola.
Não fiquei, por tudo isso, surpreendido quando tive conhecimento das conclusões do relatório do Tribunal de Contas em que se assinala, por exemplo, que face aos objectivos iniciais, se verificou um aumento no investimento estimado em, pelo menos, 218,5% (mais do triplo) não obstante abranger apenas 64% (26% abaixo) do número de escolas que se pretendiam modernizar. Ou seja, para fazer menos do que era prometido, gastou-se muito mais dinheiro do que era necessário e, como também é evidente no relatório, este foi muito mal distribuído. Se olharmos ao custo por metro quadrado da reabilitação das escolas, chegamos a um valor que concorre com o preço de construção de uma moradia de luxo na Foz.
Já me surpreende que, perante esta evidência, se tente explicar aquilo que não tem justificação. A propósito, Maria de Lurdes Rodrigues chegou ao ponto de dizer, no Parlamento, que se tratou de uma grande festa. Incomoda-me que uma das maiores responsáveis por essa festa não seja capaz de admitir os erros da rapioca que caucionou, e que tenha o descaramento de dizer o que disse. Aflige-me que o Partido Socialista ainda não tenha compreendido, ou teime em não admitir publicamente que a festa socrática custou aos contribuintes portugueses mais de 80 000 milhões de euros em endividamento em seis anos, sem que isso tenha resultado numa modernização real do país.
Numa altura em que o país se vê forçado a mudar de vida, a Parque Escolar é um exemplo de um tempo histórico em que muitos objectivos consensuais foram atraiçoados pelo despesismo, pelo clientelismo e pela irresponsabilidade. Não admira, por isso, o sentido das sondagens revelem que os partidos do Governo voltariam hoje a ter a maioria, se houvesse eleições. Os portugueses estão a sentir na sua bolsa a maior das crises de que há memória mas não esquecem a história recente. Como me dizia um velho amigo, que sempre defendeu os ideais de esquerda, as audiências parlamentares às antigas ministras da educação de José Sócrates foram uma extraordinária benesse para este Governo...» Rui Moreira
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