SOLIDÁRIO COM OS 'PALHAÇOS' DA PONTINHA

«A Es.Col.A ocupou ontem a Fontinha. Não se sabe até quando. Não sei mesmo se, quando o leitor vir este texto, já a Polícia de Intervenção 'limpou' de novo a escola e impôs a ordem. Que ordem? Há realmente uma ocupação ilegal? Vejamos em detalhe. 1. O edifício da escola da Fontinha é da Câmara do Porto? Oficialmente sim. Mas o ponto é este: servia para alguma coisa antes do grupo Es.Col.A lá estar? Não. E aquele prédio é de quem? Do ponto de vista público 'pertence' à Câmara, ou seja, aos moradores da zona. Quando o presidente da Câmara os manda sair à força não sei exatamente em nome de quem é que actua. Os munícipes que contam são aqueles que estão ali (não os que moram na Foz ou em Miragaia). Aquela velha escola devia estar ao seu serviço e finalmente estava. 2. A Câmara exigiu 30 euros de renda e um contrato de comodato (empréstimo). Parece sensato mas Rui Rio poderia ver que, por detrás da Es.Col.A, há uma cidade a 'mudar'. Uma história: na década de 80 em Curitiba, no Brasil, a edilidade não conseguia lutar contra o crescimento das lixeiras na favela. O que fez o presidente Jaime Lerner? Decidiu pagar um pequeno valor pelo lixo recolhido e entregue no local certo. Assim, em vez de ter os moradores a contribuir para o caos, contou com eles para mudar radicalmente a cidade e fez Curitiba figurar como um dos casos mais extraordinários de mudança social e ambiental no Mundo. A decisão permitiu-lhe ainda poupar muito dinheiro em serviços públicos. Curitiba era um caso muito mais complexo do que o que estava em curso na Fontinha. Há inúmeras escolas da cidade abandonadas. Há jovens adultos com vontade de participar em movimentos de solidariedade social, até como meio de encontrarem um sentido para a própria vida. É uma mudança gerada pelos novos tempos do desemprego jovem e do regresso à agregação social de proximidade. Mas o que faz a Câmara? Recusa perceber o que aí vem. Faz mal, porque os novos tempos do Porto também se fazem destas pessoas que estão disponíveis a viver uma vida de pobreza em prol dos outros. Ora, num tempo em que é tão mais fácil entrar pela marginalidade ou emigrar, isto parece uma boa ideia. A cidade precisa de gente assim - desde que os moradores aprovem. O novo Porto cultural e jovem também é isto e não apenas a 'movida' ou os bares dos universitários. 3. A Fontinha não encaixa no formato "pobres" ou "político que ajuda/povo que agradece" tão ao agrado do "populismo democrático" de Rui Rio. É mais fácil pintar os bairros sociais e colocar-lhes televisão por fibra do que encontrar um modelo económico e social para a cidade. O Porto é um vazio de novo emprego, exceto o cultural (que surgiu à revelia da Câmara, nunca o esqueçamos). A Es.Col.A é uma forma não-convencional de cultura urbana. Naturalmente não aceita a exigência de menção obrigatória do "apoio da Câmara do Porto" em todas as ações culturais. O ridículo da dupla Rio/Teixeira não tem limites. Exigência essa, recorde-se, que impede qualquer instituição da cidade de criticar a Câmara sob pena de perder a esmola. Obrigar a 'Fontinha' a agradecer a oportunidade faz de facto lembrar a propaganda nazi no gueto judeu. É triste, mas é verdade. Duas notas de rodapé: este 25 de Abril começou a tornar clara a cisão política do PS com a troika/Passos Coelho. A decisão reflete uma coisa mais perigosa: a mentira do Governo quanto ao corte dos subsídios em 2014 pode ter sido a gota de água na coesão social e Seguro percebeu obviamente isso. O candidato que achava pesado o PEC IV transformou-se no primeiro-ministro que se esqueceu de avisar os portugueses que a austeridade dura mais um ano do que o previsto... Mente ou é apenas um jovem alto e loiro? A segunda nota: finalmente o 'buraco' da Madeira transformou-se num caso de Polícia. O "Diário de Notícias" fala em mais dois mil milhões de dívida escondida tendo por base o sistema do costume - construção civil e investimentos feitos à socapa das contas públicas. Será que nem assim Jardim se senta no banco dos réus? Se assim não acontecer, é melhor fechar de vez os tribunais.» Daniel Deusdado

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