PROFESSORES NO PATÍBULO - II


- Paisinho, as pessoas que batem nos professores são más?
- Não, Lindo, claro que não. Hoje pode-se bater nos professores à vontade. A base moral de um país moderno e desenvolvido, como Portugal, é esta possibilidade maravilhosa de poder bater à vontade num professor.
- Então, quanto mais desenvolvido for o país, mais se terá batido num professor?
- Claro. Reparaste como o Ministério da Educação dá o exemplo e lhes bate, encharcando-os de papeladas, de complicações burocráticas, de trapalhadas e minudências legislativas contraditórias entre o espírito integrador e a frieza excluidora, afastando-os, aos professores, do essencial? Reparaste como este Ministério pressiona as escolas para adoptar no curto prazo todo o tipo de ideias peregrinas, frutos de bem pagas comissões e consultadorias bem pagas, ideias que depois morrem não sem gerar perplexidade e angústia naqueles palhaços igual a zero, professores apanha-bolas e paus para toda a colher professores? Se o Ministério que é Ministério bate nos professores com toda a força que pode, toda a gente deveria poder bater também. E é o que acontece.
- Quem é que pode bater mais vezes nos professores, paisinho, a seguir ao Ministério?
- Os pais. Sabes que as Associações de Pais estão muito em cima do acontecimento. Eles zelam para que os alunos favorecidos continuem favorecidos e os já excluídos sejam o mais rapidamente excluídos da escola, numa perspectiva de limpeza de ares e equilíbrio social. É do mais aterrorizador para os professores haver quem lhes inquira procedimentos duvidosos e faça as devidas devassas à sua competência e ao seu rigor.
- Mas e se depois houver quem fique sem poder bater neles por já se terem esgotado professores para bater?
- Não te preocupes com isso. Os professores eles mesmos baterão nos professores. Eles policiam-se e adoram denunciar-se uns aos outros num fluxo perpétuo e permanente de tricas frescas. Os mais amedrontados, os mais inseguros, os mais insatisfeitos com a sua vida íntima, os mais legalistas e 'cumpridores' da letra da lei, acharão ainda agenda para fornicar com os outros colegas, os baldas, os incumpridores, os condescendentes com o aluno concreto, os humildes, os bonzinhos, os ilimitadamente pacientes para com a ralé monstruosa e desprezível dos alunos.
- Compreendo. Não têm por onde fugir das sovas, então.
- Pois. Não te aflijas, todos os professores estão a ter o que merecem, depois de décadas de rebaldaria pseudoformativa, enorme absentismo ao trabalho, tácticas as mais espertas para não estar na escola, não estando, mas recebendo.
- Paisinho, a Ministra da Educação também é professora?
- É. Dizem que sim.
- Vão bater-lhe também?
- Infelizmente não sabemos, Lindo. O que sabemos que é que se ela apanhasse uma turma, não com um ou dois, mas com 25 alunos rebeldes, desobedientes, insidiosos, insolentes, absentistas e omnipresentes, mal-educados, agressivos, vandalizadores de todo o objecto público ou privado, perturbadores de todo o discurso docente ou discente, boicotadores da mais santa iniciativa seja de quem for, a Ministra-professora NUNCA teria sido tão vaca nesse canino, governativo e sistémico, soltar de cães aos sacos-de-pancada professores.
- Eu sei, paisinho. O exemplo vem de cima.
- Lindo, o que vem de cima é o mau exemplo.

Comments

Popular Posts