VERMEÁRIO - TEM A PALAVRA O DIABO


Ó delícia de formigueiro entre a roupa e o corpo,
excitação antecipada de virem eles a ser de bichos comedoiro,
é como um apanhar de uvas,
na grande vindima do não-vale-a-pena,
quando o mundo desaba e o laxismo para o bem vem reclamar a sua presa...
Por que é que o rigor mortis dos merdomens tresanda à arbitrariedade do de Lá de Cima?
Por que me agrada tanto haver desgraças e desgraçados?
Quero é os vermes, os morcões e as adoráveis minhocas lá, aí,
no miolo da terra, a processar tal esterco, mal desça ele ao humiliatório - vexatório túmulo:
eis a festa mais irónica que há: o equívoco
de os merdhumanos se acharem gente eterna e importante,
mesmo na confusão lúcida de não crerem em nada,
de crerem não ir a lado nenhum,
o que me convém e me é mais doce que o mel.
Só têm a sorte de ter um corpo. Gente com corpo! Grande invenção!
Enquanto passeiam sensorializam tudo e nem dão valor!
Deu-se o Lá de Cima ao trabalho de lhes criar um corpo: tanto espaço só para haver corpo com corações livres, sensoriais e sensíveis, se possível a Si.
Debalde!!! Comédia divina!
Ruína do Cosmos é haver estes poços de banha por lipoaspirar verminoso,
estas ilusões de alguma felicidade
numa culinária efémera,
num inocente cigarro,
numa velocidade alcoolizada.
E eu é que sou cornudo!
Svm capitalista! Sou o decapitador, literal e figurado.
Lavo as cabeças, levo-as também, faço por que se percam entre papéis e munições,
e inspiro os crimes e as sacanices de qualquer dimensão.
Mais adoro o orgulho incomensurável do Mourinho e a sua régia vaidade
que uma mariscada
em dia ameno regada de cervejas e caipirinhas, a ver as gajas passar.
Há petiscos para mim em haver quem foda fora, o tesão é fada que me fede a rosas,
sou eu que inspiro a mudar de prato, a inovar, que mulheres é coisa de comer até gastar:
e haja fartura.
Semeio desespero e impiedade - sou o primeiro a rir e o último
- cada acidente abençoa-me a sementeira com novas lágrimas e dores inteiramente grátis,
sou o joio entre o trigo, a pedra no meio do arroz, a pevide no gelado,
cada solteirona feia me louva porque tanto estou no seu vibrador imoderado
como na sua cama vazia, semeando o mesmo efeito de fome imperfeito,
estou todo nos apetrechos do século, camarada.
Estou nas grandes serras mecânicas, camarada,
nos grandes emagrecimentos que levam a doenças graves, camarada,
nas depressões e na alegria da tristeza, camarada,
estou nos grandes aviões que caem,
nas grandes sex-shopes que não servem para nada,
estou entre as pernas das fêmeas insatisfeitas
e na desoladora falta de erecçãozinha dos machos assassinos por isso mesmo.
Sou o desperdício e o labirinto.
Sou a festa de comer sem fome,
a festa de beber sem sede.
Sou a bosta mais irresistível, meu amigo!
Vens lamber o lago de pus do dinheiro na minha mão, camarada.
Eu, amigo das purgas.
Eu, fanático das zangas, das navalhadas,
das fúrias momentâneas sem ponto de retorno.
Eu, o do sangue derramado e da palavra danosa, o melhor companheiro do desânimo!
Sou de morte! Sou amigo do peito!
Sou escarninho! Sou perfeito!
Sou faz de conta que revolucionário das coisas que ficam como estão!
Sou livreiro, sou porteiro, sou um chuto, um chulo, uma passa,
gestor da clínica infanticida, maravilha,
insecticido-te com um sorriso insecticida, colega!
Sou o vai pró-caralho-e-bom-proveito a toda a gente e a toda a hora!
Sou a discoteca na morgue.
e a morgue em casa!
Sou a víscera,
Sou a bílis.
Sou a praga de gafanhotos do teu sossego,
o conselheiro dos padres abrutalhados.
O meu nome é hoje impronunciado. O d'Ele impronunciável.
Este é o campeonato em que a perder é que eu ganho.

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