HISTÓRIA SOMBRIA DE UMA SOMBRA


Mumiamente, ele germinava a sua doença no segredo do seu lugar
desertado por todos. Houve um tempo em que o seu segredo estivera sepultado:
era terrivelmente feio.
Tinha uns olhinhos pequeninos, enterrados numa face gorducha
e o efeito de se olhar para ele era o de se olhar para um sapinho que,
porque usava uns óculos escuros, talvez Ray-Ban (era um homem rico!)
convidava a que se lhe chamasse genialmente Rabo de Bane.
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Por razões complexas com toca e caverna de vida dentro,
de o terem atormentado em pequenino, não sabemos!, Rabo de Bane,
sentia-se sempre perseguido, sem o ser de facto,
e nomeara-se messias laico anticorrupção
e pró-justiça, sem mandato e desproporcionadamente histérico.
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Por isso mesmo, boa parte da sua vida fora passada a coligir dados de supostos inimigos,
a coleccionar quezílias, a roçar o traseirito ocioso e flácido por tribunais,
a apresentar queixas e queixinhas, a desassossegar a vida de tanto pai de família,
arrolando vítimas, amontoando queixas, acusações, acumulando currículo de Chato na Justiça,
porque o seu grande passatempo era, afinal, arranjar problemas para os outros
e ficar na sombra a esfregar as mãos nesse prazer sombrio de desassossegar,
de levar aos outros as custas filhas da puta da Lenta e Injusta Justiça Portuguesa.
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Tinha também um lado letrado, pomposo, a par de um lado 'agente infiltrado'.
A dado passo, convenceu-se de que construíra uma obra literária extraordinária,
cravada de rimas e versos e que não podia, a obra, ser manchada por quaisquer corruptelas
da sua imagem de deus imaculado denunciador dos maus,
mesmo que tais corruptelas inadvertidamente autocorruptoras e automanchantes
lhe descaíssem por própria mão.
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Na verdade, Rabo de Bane bipolarizava à força toda. Parecia de esquerda,
mas moralizava e dava sermões como os da direita. Tinha uma predilecção especial
de assediador por Alberto João Jardim, e satirizava-o de uma sátira pomposa e ridícula.
Parecia medianamente culto, mas era sofisticadamente malévolo,
o lado 'agente infiltrado' enchia de indecências e anonimatos os seus ciúmes
e acessos de assédio: um dia deu de frente com o PALAVROSSAVRVS REX,
inicialmente amistoso, começou a perder na competição,
e concluíu que lhe era obstáculo e concorrência intolerável a que deveria pôr cobro.
A escrita PALAVROSSAVRVS encandeava-o, hipnotizava-o de fascínio,
ao mesmo tempo que o deixava tenso, desarranjado,
perturbado da raiva que lia como raiva apenas.
Ler o PALAVROSSAVRVS era-lhe antídoto de quantos xanaxes tomasse.
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Foi no tempo em que a Internet entrou por ele, Rabo, adentro e se tornou magno visitador,
magno lisonjeador, tão omnipresente até à náusea que, quando uma vez, sôfrego,
tentava anonimizar um insulto, saíu-lhe o nick para a verdade,
denunciando-o, desmascarando-lhe a sanha na minha caixa de cometários.
Reduzido à obviedade do seu maligno agir encoberto e covarde,
Rabo de Bane tentou convencer-me a apagar o deslize que o comprometera de sincero,
encolheu-se todo defensivo e, muito temente do Mundo todo, nunca mais
se atreveu a andar de blogue em blogue, de nick descoberto e cabeça,
na safra da lisonja,
mas determinou-se a tentar desmoralizar e destruir o cerne PALAVROSSAVRVS
do seu problema de ciúme com obstinação canina.
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Uma personagem doentia e demoníaca passou a atormentar anónima de insulto
o PALAVROSSAVRVS até ao cansaço de ler, até ao hábito conformado de apagar sem ler.
Perante as minhas desventuras, exulta silencioso, esquecendo o prazer com que,
na escrita, catarse me gero tanta além desventuras. Ao saber-me Amado,
Feliz, Mais Reconhecido, incha de raiva e enlouquece.
Nessa altura, adjectiva, explana arrazoados queixosos
que aparecem como espectro do Mundo das Sombras
- tem os nomes, tem o discurso armadilhado com ânsias de ser muito vítima
e nada lhe cura a sua alma, o seu espírito de toca a cavernar,
cara de Rabo de Bane, sapinha.
lkj
Um dia também me acusou a mim de o acusar a ele de ser sombra
e de agir na sombra contra mim, macerando-me de insulto.
O processo tramitou e destramitou,
incomodou-me, foi na GNR que ouvi ler o seu argumentário cerrado urdido contra mim
e que lhe vi o rosto de sapinho pequenino e escondidinho sob a prótese ocular escurecida,
levou-me a gastos com advogado, o qual, quando foi desenterrar tudo aquilo,
constatou que Rabo de Bane, afinal, não deduziu acusação particular contra mim
e o Ministério Público determinara já há algum tempo o arquivamento do auto.
Foi aquele desfasamento temporal que conduz a prejuízos o pobre cidadão desvalido.
Missão cumprida: Rabo de Bane cumpriu o seu propósito lesivo de mim, na alma e no bolso.
Depois, sombrio, tratou de regressar às intermitências sombrias de sai por vezes.
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E não me larga, e não me deixa em paz,
e não esquece que apanhou antes que esboçasse dar,
e, se deu, deu só à tração, especialista sombrio em tão bem arquitectados escondimentos,
arquitectada sombra, Ser e Lugar, de que só sai para verter fel
e para ser o mais vítima possível,
mas na sombra, sempre na sombra.

Comments

antonio ganhão said…
A tua prosa devia guindar-se a outros temas, mesmo quando se reveste de raiva e de fúria, que curiosamente não é o caso presente.
quintarantino said…
Fellini, não te apoquentes... abundam os espíritos menores que a coberto do anonimato ou dos textos blogados sem possibilidade de comentar se sentem Hércules, gigantes... não passam de meras amibas!
Robin Hood said…
Quem é quem é? Isso trata-se no Cadeirão da Malta. Amigo no Cadeirão da Malta tudo se trata. Desancamos no gajo ou não?
Aos tarados não se liga Joshua. Há pessoas que não merecem que as olhemos duas vezes, que empeçonham tudo em que tocam, como diz Henri Troyat.
Beijinhos
São said…
Gostei.

Saudações
Robin Hood said…
Põe sebo nessas canelas e vem assistir ao espectáculo gratuito no Cadeirão da Malta. Outro peixe mordeu o anzol. E as palavras serão balas nas cenas dos próximos capítulos.
Tiago R Cardoso said…
Por acaso acho que vi o fulano um dia destes a dar umas observações lá no outro lado.
Esquece Joshua e segue o teu caminho.

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