CAMÕES POR CONHECER E POR AMAR
«A sensualidade camoniana tem, por certo, correspondência na erótica de Donne e no lirismo amoroso de Ronsard. Prescientes do dualismo que Descartes afirmará triunfante no século seguinte, os poetas proclamam a soberania do corpo, dando luminosa e às vezes urgente expressão a uma carnalidade que os distingue do ascetismo místico, por arrebatador que seja, dos avilenses Juan de la Cruz e Teresa de Jesus. Do mérito e superioridade da experiência física e plenamente erótica do amor, Camões deixou testemunho liminar: “Melhor é experimentá-lo que julgá-lo, / Mas julgue-o quem não pode experimentá-lo.” A liberdade erótica tem a sua expressão suprema na imaginária Ilha de Vénus, do Canto IX, povoada de Ninfas que “Nuas lavar se deixam na água pura”. Como prémio terreno para os heróicos trabalhos dos lusitanos “Em cristalinos paços singulares / … / Os esperam as Ninfas amorosas, / De amor feridas, para lhe entregarem / Quanto delas os olhos cobiçarem.” E não se nega aos sentidos o que os olhos cobiçam: “Acende-se o desejo, que se ceva / Nas alvas carnes, súbito mostradas”.» Manuel S. Fonseca
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quem tem um olho é rei'