AREIA PARA OS ÓCULOS

Luminoso o texto de JMF acerca do nosso sistema de Saúde e de como a sacralização imobilista do que temos, visto como intocável, visa esconder uma ineficácia que não é de todo aceitável, tanto mais que brandir a bandeira demagógica do nosso Estado Social equivale a disfarçar os seus défices abomináveis e as falhas na promoção e libertação das pessoas que o percorre, marcando-o antes dependências cíclicas engendradas pela política dos partidos de poder com o controlo de consciências através da compra do voto mediante simbólicos e transitórios benefícios: «Seja qual for o critério que apliquemos, ou o índice que preferirmos, “o período de maior crescimento e consolidação do Estado-Providência foi também o de mais forte crescimento da desigualdade de rendimento”, como escreve Luciano Amaral em Economia Portuguesa, As Últimas Décadas, o pequeno mas fundamental livro recentemente editado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos. Se as políticas se medem pelos seus resultados e não pelas suas intenções, num país onde se gritasse menos e se pensasse mais aquela simples constatação impediria que se transformasse o nosso Estado social numa arma de arremesso político. Pela razão simples de que um Estado-Providência que falha num dos seus principais desígnios – o de fazer diminuir as desigualdades sociais – é, no mínimo, um Estado-Providência que merece ser questionado. [...] Como notou José Mendes Ribeiro em Saúde, A Liberdade de Escolher, com base num índice calculado a partir do ano-base de 1995, até 2006 “a produção do SNS cresceu apenas 30 por cento em termos de consultas, internamentos, urgências e cirurgias, mas o respectivo financiamento cresceu 150 por cento.” O que é insustentável. Até porque, apesar de gastarmos no sector uma percentagem do PIB superior à média europeia, o relatório relativo a 2009 do Euro Health Consumer Index colocava Portugal em 21.º lugar entre 33 países europeus, só tendo atrás de si os antigos países do Leste. Ou seja, melhorámos muito, mas o modelo de SNS não é ideal nem devia ser intocável. Por tudo isto, é surpreendente que não se queiram discutir mudanças. Que nem se olhe, por exemplo, para o que está a acontecer a uma velocidade estonteante no Reino Unido, onde a coligação conservadores-liberais desencadeou um processo de reformas que a revista The Economist – antes céptica em relação a este Governo – designou, num editorial intitulado “Radical Britain“, o “grande jogo”. Prevendo que, “tarde ou cedo, muitas outras nações do mundo desenvolvido terão de seguir pelo mesmo caminho”.»

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