Solitário Graal

Ontem conservaste-te imóvel enquanto te desenhava,
com o mais pequeno e estreito dos meus dedos,
uma estrada larga,
aquela de que te disse: «Por aqui é mais rápido por um Oásis mais perto».
Desenhei-ta com todas as árvores a ladeá-la,
pus à tua frente o delicioso plano inclinado que, à medida que avançássemos, nos permitiria a ambos
ver ao fundo o mar crescendo para nós.

Pus todo o meu entusiasmo e fervor nesse desenho.
Por essa estrada sopraria a brisa marinha mais perfeita
e nela ondularia o odor mais sublinhado do manso e rumorejante pinheiral, que inebria.
Por ela fora, seria com um amplo sorriso que o suor dos nossos rostos
passaria às costas das nossas mãos e delas gotejaria radiante no pó do caminho
num sal cadente nunca em vão.

Não quiseste.

O teu olhar emudecido devolveu-me gelo e indiferença.
O teu olhar era toda uma argumentação fechada já definitiva: «Não me parece que vá».

Eu já sabia, mas tinha de tentar não ter de ir só a essa espécie de Céu, mas contigo, convosco,
(porque 'tu' são muitos, estais perto de mim e não me acreditais, considerais o sangue, as lágrimas e o suor com que aprendi o caminho, apenas desprezível delírio e deixais-me só, entregue ao que sei).

Assim, é com os pés nus que vou só
ao meu Graal:
empreendo a travessia,
faço a subida.

E chegarei lá.

Joaquim Santos

Comments

José Leite said…
Ai esse Graal tem sido motivo de tanta polémica! Deixai-o na paz eterna...

O delírio atingindo o êxtase!
Catarina said…
Obrigada pela visita ao meu cantinho!
Volta sempre. :D

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