CAPOTE ALENTEJANO RULES
Na minha família há um capote alentejano. Já o meu bisavô tinha um, lembro-me bem. [Assim como me recordo do trauma de, puto com quatro ou cinco anos, meus pais me terem dado um em cuja orla me fartava de tropeçar. Por isso e pela confusão infantil do por onde meter os braços, resistia-lhe. Éramos assimétricos. Ainda muito pequeno eu. Ele ainda comprido de mais para mim. Certa vez, no caminho para a missa, com o meu avô, tropecei no meu capote. Caí de bojo, braços presos. Raspei o buço na laje areada, já perto da Igreja. Chorei desconsolos infinitos e uma dor de beiços pelo abrasivo do solo. Ganhei o meu primeiro bigode em ferida e uma viagem compensatória de combóio a Espinho ou Ovar, nessa mesma tarde. Teria razões para odiar o capote. E ainda mais por ter visto, muito criança ainda, um filme italiano, Il Capotto, que me fez chorar sangue de pura piedade pela má sorte do protagonista roubado do seu querido cappoto. Aquelas lágrimas à chuva, ao frio.] Não se estranhe ainda vermos Obama ou Putin orgulhosamente metidos num capote alentejano. Seria a consagração planetária acrescida, na alternância do gelo entre hemisférios, apesar da contenção de José Alpedrinha para evitar a vulgarização e conservá-lo como é: um produto selectivo. Feito para a vida, até as raposas se eternizam naquela gola consoladora.
Comments
Aquele abraço
Cá o alentejano só se tem safado neste frio com o seu capote que tem 42 anos. É dos bons, daqueles que a chuva bate e cai. E não tem peles na gola. Desde miúdo que sou anti-caça.
Abraço
Quanto ao capote, dá-lhe uso.
Quem me dera um, fica sabendo.