UM GESTOR NÃO FALA COMO UM PADRE
Quando tudo é lucro e sustentabilidade, mesmo o mais sagrado, saúde e educação, nada de humano pode prevalecer. Ora, compreendendo bem o presidente e a coordenadora nacional da Autoridade dos Serviços do Sangue e da Transplantação que pediram hoje a demissão em protesto contra as intenções do ministro da Saúde de cortar as verbas daquele organismo, parece-me mais premente, em vez de insultar o ministro, insultar o passado socialista, insultar a amorfia que bafejou todas as obras de ostentação e toda a lógica de dependências sociais, com os seus abusos grosseiros, que fazem do Estado Português refém dos números. Também se deveria insultar certas preocupações tardias. Paulo Macedo, católico praticante e excelente gestor, fala como gestor. Se falasse como padre jamais diria que «pode não haver o mesmo número de transplantes» ou que «é preciso perceber se o país pode sustentar o actual número de transplantes.» Estúpido é não haver dinheiro.
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E eu pergunto por que é que existem incentivos? E para quê? Para quem? Parece que os médicos precisam de dinheiro extra para fazer o seu trabalho que já é remunerado.
Segundo a responsável que se demitiu "A colheita [de órgãos] não sobe nem desce por milagre, tem de ser apoiada": apoiada? Excepto nos poucos casos de dadores vivos, a colheita de órgãos depende das pessoas que morrem e que servem como dadores, ou seja, depende do destino, do acaso, do azar (dos que morrem) e da sorte (dos que vão receber os órgãos). E precisam de apoio ou incentivos em quê?
O Ministro não falou que queria cortar com os transplantes, mas sim "menos incentivos aos hospitais, porque também não é necessário".
Estes "responsáveis" que se demitiram são muito espertos: com estes futuros cortes, aperceberam-se que o tempo das vacas gordas tinha acabado, logo, decidiram demitir-se, como fazem os ratos que abandonam um navio quando este começa a meter água. É mais fácil desistir do que aguentar as dificuldades (o tacho não deve ser o suficiente para estas chatices). E em histeria, demitem-se por estarem em desacordo, por terem sido ofendidos, por estarem magoados na sua dignidade (onde é que eu ouvi isto recentemente). HIPÓCRITAS!
Se estivessem realmente preocupados com os doentes, mantinham-se em funções e defendiam os seus argumentos junto do Ministro. Até podiam prescindir de grande parte do seu salário para ajudar nas despesas, mas não, preferiram demitir-se.