PARÁBOLA DA SOLTURA NACIONAL
A Selecção passou, mas o País está de diarreia. O Regime está de pé apesar de estar de rastos. Com tanto lixo evacuado e mal limpo, soa impossível que haja ainda mais alguma coisa de grave a exasperar a sensibilidade difusa dos cidadãos. Há diarreias tão devastadoras nos seus espasmos evacuatórios que o penitente sente já só lhe faltar cagar o próprio cérebro. Os lobos esfaimados continuam ao alto, à espera que tudo passe e qualquer desculpa sirva de atenuante, mas isso tem custos anímicos e corrói toda uma sociedade de sacrificados, desmoralizando-a. A Cristo o que é de Cristo e a Judas o que é de Judas no que toca à dignidade de Portugal. Vale mais que um só Judas pereça, vade retro, Judas!, que todo um povo se afunde no inferno da vergonha. Podemos ser todos responsáveis por uma cultura de antivalores insinuando-se e corroendo a nossa sociedade, mas as responsabilidades têm de ser atribuídas sob pena de a lei e a sua transgressão se anularem ou equivalerem. Podemos ter pena, profunda pena, do nosso próprio algoz? Podemos. Eu, que nunca pude poupar a jactância insana de Sócrates, tenho pena dele. Ao chegarmos a esta fase em que o Regime se desnuda, mas para mostrar umas carnes nada convidativas a um sexo feliz e gratificante, senão para lhe admirar a lepra com que se desfazem os membros, os seios ameaçam cair e o esqueleto escangalhar-se, a pena é ainda maior. Pena e compaixão por se ter alcançado um tal grau de degeneração cristalinamente aqui descrito. Ou continuamos cabisbaixos, ou vociferamos aos quatro ventos, ou corremos todos os riscos por insistir nesta falsa vexata quaestio ou não temos remédio! Tenho pena de Sócrates. Mas tenho muito mais pena de Portugal, chupando a guloseima do Mundial e amargando misérias, desempregos, incúrias, a lógica devastadora de um Povo Brando por um enxame de gafanhotos corruptos.
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