TRETA DO GRAVE E DO GRAVÍSSIMO
Não há machado que corte a sensação global de impunidade em Portugal, a cada caso de peso, envolvendo gente execrável sempre à tona da caca que segrega. Em vão se escreverá, em vão se intervirá, quando os dados estão perfidamente viciados e depois sobeja toda a espécie de branqueamento e inconsequência. Mesmo o argumentário usado por certos blogues, na defesa de qualquer acórdão da treta como o do Free Porc, passa pela compulsão ao silêncio de quem ouse duvidar e levantar questões. Tem, por isso, toda a piada que, no uso da sua liberdade de raciocínio, Daniel Oliveira escreva isto: «No plano político [...] havia um debate (independente da investigação judicial) a ter sobre este caso: a que se deveu a pressa de, em vésperas de passar o poder para outros, encerrar o licenciamento daquele projecto, tendo em conta todas as dúvidas que subsistiam quer em relação aos efeitos ambientais da obra quer em relação às estranhas alterações que se fizeram aos limites da zona ecológica?», e logo a Isabel Moreira, a quem ontem dei um beijo e recebi outro, de modo pertinaz, ouse, em resposta, escrever isto: «Como estamos num Estado de direito, Sócrates é inocente, ponto, pelo que "gravíssimo", Daniel, é continuares a colocar a primeira hipótese.» e suceder que alguém atentíssimo ao transe responda isto: «Este post da Isabel Moreira é um verdadeiro tratado. Em duas linhas, vários equívocos. Confunde-se “presunção de inocência para efeitos judiciais” com “inocência”. Confunde-se “ausência de prova” com “inexistência de prova”. Defende-se que as decisões das autoridades judiciais são incontestáveis e insusceptíveis de crítica. Defende-se a supressão das dúvidas e da crítica política com base num argumento jurídico. Em suma, defende-se a submissão da opinião aos ditâmes do juridiquês mal amanhado.» É rigorosamente o que parece: um baile particular onde se está obrigado a dançar o tango, havendo, pelo meio, a Isabel Moreira com a velha ameaça velada a quem se recuse dançar conforme a música.
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O primo Hugo Monteiro admitiu aos investigadores que "o encontro do pai Júlio com o primo Sócrates teve influência no licenciamento" e informou que ele próprio se deslocou a casa de José Sócrates "e lhe disse que ia invocar o seu nome, a que [Sócrates] terá acedido". Além das outras 25 perguntas, Paes Faria e Vítor Magalhães queriam ter "explicações" de Sócrates para os testemunhos do tio e do primo no processo. Mas, como disse ontem, a directora do DCIAP não considerou que a audição ao primeiro-ministro fosse relevante.