NOTAS COM PRISÃO DE VENTRE


As biografias de jogadores de futebol normalmente são medíocres em tudo.
Mesmo as dos treinadores de futebol o são claramente
(a de Mourinho estava gralhística e terrivelmente mal escrita)
assim como a de certos presidentes de clubes, que têm um péssimo estilo,
por muito que vendam. «O Menino de Ouro do PS»
é um título claramente futebolístico!
lkj
A biografia autorizada de José Sócrates, o mais célebre optimista da nossa praça,
não foge à regra. O quê? O biografado não é nem jogador,
nem treinador, nem ex-amante de um dirigente desportivo?
Pois não, mas a lógica que subjaz ao livro é a mesma:
passar a existir, poder vender a existência,
forçá-la a todos, a essa existência, mitificar o saco de batatas.
E também exemplificar esses princípios batidos de auto-ajuda: Eu consigo!
Eu era obscuro mas tornei-me no primeiro Primeiro-Ministro profissional do Mundo.
Os outros são pessimistas e negativos. Mas eu sou optimista e positivo.
Ou outros não tentam e por isso não conseguem.
Eu consigo porque acredito, tento e luto.
lkj
O resultado? O resultado é a venda intensiva de livros
como aconteceu com Vitor Baía, Nuno Gomes, Carolina Salgado ou Figo,
as quais, biografias, como se sabe,
todas elas são rápida e extraordinariamente bem vendidas
e logo a seguir, por serem esquecíveis,
bem esquecidas em Portugal a não ser por cineastas e procuradores-gerais-adjuntos.
O resultado é atirar mais achas-porreiro-pá para a fogueira das vaidades espectaculares
em causa e produzir contraste com o que vai maioritariamente de oposto
nas bastas psiques de desempregados, desiludidos e falidos em Portugal.
lkj
KiWitorino e Dias Loureiro foram, histriónicos, ao show patético de lançamento
de este best seller anunciado, o primeiro perorando, dentro do seu habitual número de circo,
sobre o profissionalismo político do biografado, um precursor na matéria.
O segundo a atropelar-se nas palavras e a arranjar ideias para levitar
da maledicência e da malquerência públicas essa figura benfazeja para todos, o PM:
sofregamente o dizia tão hiperbólico que doia,
lembrando muito o muito inócuo e inexistente Alberto Martins,
líder parlamentar! E Dias Loureiro testemunha ter-se emocionado!
O homem relatou que se emocionou com o inesperado lado dos afectos do biografado!
«Papá, papá, já sou Ministro...» A emotividade e Dias Loureiro seriam outra Biografia!
Passar a existir, emergindo das cinzas da irrelevância, emociona qualquer um.
Aliás, demos de repente pela sua existência, pela de Dias Loureiro,
precisamente pelo que de magnífico e encomiástico teve a dizer do PM e da biografia,
ali na solidão pungente daquela sala às moscas.
Não consta que nos apercebamos dele em lado algum a fazer alguma coisa.
Pronto, há o Conselho de Estado. Mas agora sabemos que o zénite do fervor socratinesco
não está em Alegre e quejandos, não!, está todo em Dias Loureiro.
Cheira-me ao milagre das chantagens contagotísticas do QREN,
tendo em conta os bons comportamentos opinativos sobre o PM
como critério, na dúvida, para dele, do QREN, se beneficiar!
lkj
Mas afinal, o que é que se biografa aqui? O desrespeito pelas regras?,
pela clareza de processos?, biografa-se a política-espectáculo?,
a técnica da dilação?, do encapotamento?, das meias-tintas?,
da mentira e outros artifícios processuais?, uma certa pressãozinha?,
um certo controlozinho bem apertado?, uma certa deriva personalista e imagística?,
um certo não olhar a meios?,
um certo afrontamento estratégico de uma classe profissional de cada vez?,
uma certa forma de preservar os privilégios da nomenklatura sustentacular do Poder
alegremente dependurada anonimamente na Grande Teta Estatal?, como?,
onerando impiedosamente toda a gente!,
uma certa forma de “retórica” do Estado de Direito e do Social, mas só retórica?,
um certo optimismo e positividade exclusivamente fotogénicos?,
uma certa solidão providencial salazarística?, sim,
essa virgindade salazarística absoluta com que se afeiçoou ao Poder
e o contempla enbevecido, compenetradíssimo, messianíssimo,
porque claramente sente ter desposado Portugal e que Portugal é todo Cio por ele,
é isto que se biografa aqui? Só pode ser isto que se biografa aqui!
lkj
A Eduarda Maio que me desculpe, mas o sucesso que auguro ao seu livro
é o sucesso da biografia do Emplastro, se lha fizessem,
a qual do ponto de vista da utilidade e do interesse gerais,
neste tempo de angústias e angustiado cerco geral a toda a gente,
seria tudo o que se encontra por aí ao preço da uva mijona.

Comments

Pata Negra said…
O Joshua mas tu leste o livro? Acredito que n�o � preciso l�-lo para fazer dele um texto que valer� mais que o pr�prio livro - um texto a reter!
Mudaria o t�tulo: notas de diarreia!
Um abra�o dum menino da rua
antonio ganhão said…
O circo esteve completo, só faltou um gigante, o que num país de anões até nem teria sido muito difícil...

O menino de ouro... era o Sá Carneiro, não era?
Pata Negra said…
Joshua, aqui estou novamente. Não costumo abordar a actualidade, quando recebo de notícia os factos, já a blogosfera pulula de análises e comentários do mais piroso ao mais acutilante e inteligente. É por isso que não me dou a esse trabalho de fazer meu casos de meninos de oiro. Acontece que este teu post me ficou a ecoar no ouvido e venho aqui "copy-álo" para o divulgar. Podia simplesmente fazer o link mas, porra, preciso de ilustrar o meu reino.
Se não concordares vai lá e risca-me e borra-me a pocilga toda!
Um abraço em concordÂncia.

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