XEQUE-MATE AO PS


«Vai fazer um mês desde que surgiram as primeiras notícias sobre o conteúdo das conversas entre José Sócrates e Armando Vara no caso Face Oculta. Recordemos que essas conversas, conforme noticiadas pelo Correio da Manhã e pelo Sol e nunca desmentidas, levantam dúvidas relevantes sobre dois factos que em qualquer democracia seriam objecto de fiscalização através dos canais próprios: 1) o conhecimento pelo primeiro-ministro desde Março passado, contra o que o próprio anunciou no Parlamento em Junho, do processo de compra da TVI pela PT. Negócio primeiro inviabilizado pela denúncia pública do Presidente e da oposição e, depois, numa segunda fase, concretizado pelo grupo Ongoing com suspeitas de financiamento parcial da PT, numa operação que implicou a súbita demissão de um dos membros da sua comissão de investimentos da empresa; 2) suspeitas sobre a intervenção de Sócrates na renegociação das dívidas do grupo de media de Joaquim Oliveira ao BCP. A estes dois factos acrescentemos um terceiro: a informação veiculada pela Sábado de que o Estado dirigiu preferencialmente a publicidade contratada pelas entidades em que influi para certos grupos de comunicação social, em prejuízo dos jornais críticos do Governo (ainda que, em vários casos, com maiores audiências). Tudo isto resulta de notícias sobre o caso Face Oculta e outras já conhecidas. Apesar de tudo, o procurador-geral da República optou por arquivar as certidões, constatando que "não existem indícios probatórios" que justifiquem a abertura de processo-crime contra o primeiro-ministro. O problema da relevância criminal das conversas de Sócrates parece ter ficado resolvido com essa decisão. Mas, enquanto ficamos à espera que Pinto Monteiro explicite os fundamentos do seu despacho de arquivamento para percebermos a radical discordância com os procuradores do caso, devemos insistir que a história não acaba nem deve acabar aqui. Não acaba, sobretudo, em termos políticos: as declarações atribuídas ao primeiro-ministro parecem confirmar um esquema de interferência sistemática na independência dos meios de comunicação social que nos deve preocupar a todos. Esse esclarecimento torna-se ainda mais necessário por essa suposta interferência ter ocorrido em período de eleições. Para impedir qualquer tipo de escrutínio do primeiro-ministro, muitos têm argumentado, com grande crispação, que informações recolhidas num inquérito criminal não podem ser usadas num procedimento não-criminal e que, sendo as comunicações de José Sócrates privadas e parte delas desprovidas de interesse público, a sua divulgação violaria o direito do primeiro-ministro à privacidade. Vamos entender-nos. Primeiro, ninguém nega que a privacidade de um primeiro-ministro não seja um valor de peso. É um valor essencial. Sem privacidade, um primeiro-ministro fica refém de toda a espécie de chantagens. Segundo, ninguém tem interesse legítimo em saber o que disse Sócrates a Vara fora dos temas políticos pelos quais precisa de ser fiscalizado. Felizmente, há uma solução possível que protege os interesses em causa (fiscalização política e privacidade) e que, ao que sei, já está em marcha no Parlamento. Essa via é, naturalmente, uma comissão parlamentar de inquérito. Segundo a lei, uma comissão de inquérito pode ser constituída sem ter na base um processo-crime; tem direito a ser coadjuvada pelas autoridades judiciárias e a receber delas todas as informações e documentos pertinentes; pode vedar e restringir a publicidade das suas reuniões e diligências e todos os seus membros têm deveres estritos de sigilo. O PS não tem como recusar uma comissão parlamentar de inquérito, se quiser honrar o seu papel na democracia portuguesa.» Pedro Lomba, Jurista

Comments

Tem calma Joshua, por enquanto é apenas xeque...
Anonymous said…
Sem cobertura

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