TEMPOS DE CABRESTO E FEUDALISMO PARTIDÁRIO

É incrível como há dias em que os leitores ávidos de blogues [cronistas, políticos, líderes partidários, treinadores de futebol] já não suportam certas narrativas demasiado repisadas. Nunca se perguntam por que são elas repisadas. Porque não há consequências. Mesmo que o senso comum atinja que o abuso foi monstruoso, não há consequências. Dentre os leitores ávidos de blogues com poder de bloqueio e movimentos livres entre os media nasce a tentação de agir. Cortar a cabeça a uma linha demasiado divergente de pensar, eis a primeira tentação. «Corta lá o pio ao gajo, pá!, que é um filho da puta.» E cortam. Hoje tive filtro. Quem ouse fazer a meticulosa autópsia do que nos aconteceu, está lixado e sob sítio. Interessa muito mais conservar o manto de anestesia que impeça o aprofundamento de um emaranhado de factos demasiado graves para se pensar neles. Este editorial superficial e habilidoso, certas intervenções expressamente para burros, no Eixo do Mal, por exemplo. Anestesia sobre quem pense, sobre quem leia, sobre quem deseja mais que o feudalismo partidário e a sua agenda. Mas é este o País dos partidos em todo o seu esplendor.

Comments

João Sousa said…
O língua-de-pau Manuel Tavares, director do Jornal de Notícias, faz um ridículo exercício de revisionismo: apresenta-nos um Sócrates trágico e injustiçado, um Sócrates tão paralelo à realidade que conhecemos que se diria resgatado a um outro universo. O Sócrates que Manuel Tavares nos pintou no Sábado (logo, não penso ser uma brincadeira de Dia das Mentiras) foi "um líder demasiado forte", um líder temido e detestado por aqueles homens menores que eram incapazes de acompanhar "o seu trabalho intenso para estar informado". Um Sócrates que criou adversários no interior do seu partido por procurar fora dele "pessoas e instituições que o ajudassem a concretizar as suas políticas" (vêm-me à memória três exemplos desse escol: Armando Vara, Joe Berardo, JP Sá Couto). Um Sócrates que "nos últimos meses de governação (...), quando já declarara a absoluta necessidade de atacar a dívida acumulada bem como as despesas de funcionamento da Administração Pública" (dívida e despesas pelas quais, fico em crer, Manuel Tavares não imputa qualquer responsabilidade aos desmandos desse Übermensch chamado José Sócrates), foi traído por "passarões especialistas em usar e abusar dos cartões de filiação partidária" que "desataram a arranjar empregos para a vida a familiares e amigos ou a concluir negócios improváveis à luz da falta de dinheiro e dos sacrifícios que a crise já prometia". "Foi assim que se passou", remata o oráculo Tavares, o pitoniso Tavares.

O Público, para não destoar, titula na primeira página de hoje "O drama e a solidão de Sócrates três dias antes do resgate" (para nada interessa o nosso drama e a nossa solidão depois do resgate) e escreve que "um dia, quando os documentos confidenciais ficarem acessíveis, saber-se-á com rigor por que razão o país foi forçado, pela terceira vez na sua história democrática, a procurar ajuda externa." Para este Público, parece haver muita incerteza sobre quais as razões que forçaram o país a pedir ajuda externa. Talvez a culpa tenha sido de Cavaco Silva, o homem a quem "Sócrates terá pedido ajuda para o salvar da troika". (Até certo ponto, foi-o, por não ter corrido com o daninho personagem mais cedo; mas mais culpados são os irresponsáveis que elegeram Sócrates em duas eleições e aqueles que o apoiaram e continuam a apoiar).

Não deixa de ser sintomático que Sócrates quisesse que Cavaco o salvasse da troika, mas não se preocupasse em salvar-nos dela - pelo contrário, como um bom proxeneta, lançou-nos para os seus braços, combinou o preço e depois ficámos nós a fazer o trabalho duro.
floribundus said…
somos todos 'arrastados' pelos mesmos
Anonymous said…
O Manel também deve saber que o BPN não foi à falência para não falir a segurança social onde o Governo Cavaco investiu os fundos. Se o banco falisse falia o Estado.

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