CUNHAL, PAPEL QUÍMICO DE SALAZAR
Cunhal foi-nos perigoso na sua servil e irredutível fidelidade à URSS e depois, com o passar do tempo, transformou-se apenas em mais um venerável e inócuo idoso pré-mumificado, ainda carismático, coerentemente petrificado, enquanto a URSS desaparecia e ficavam apenas as deletérias cinzas dela, milhões de mortos, presos políticos, silenciados, estrangulados nas liberdades mais elementares. O Político falhara. Surgiu o Artista. Avultou o Romancista. E esses são para amar e venerar, sem lentes nem peias, porque é sobretudo a humanidade, mais que a fria postulação política, a manifestar-se.
Tinha eu quatro anos quando, pela TV, e no ano da Revolução, o vi e ouvi pela primeira vez. A sua efígie terrífica causava-me medo. Aquela voz fina e salazaresca, aquele cenho fechado e esfíngico, formavam como que um todo, o qual em espelho, não passava de uma contraversão, pelo menos na concha corpórea, do velho ditador. Até à morte de Sá Carneiro, aterrorizava-me a ideia de suportar aquela hirta e hirsuta figura, incapaz de um sorriso, à frente dos destinos do meu País, coisa que sabiamente o nosso eleitorado soube evitar, embora, no período revolucionário, muito dano e abuso se tenham esparzido no País.
Infelizmente, apesar de Cunhal, Soares teve todo o tempo do mundo, na sombra ou às claras, para tratar da sua vidinha, cevar-se de todos os modos possíveis com o pão de ló dos recursos nacionais, dos financiamentos partidários internacionais, e a manha de empatar um Estado limpo, próspero, à prova de gatunagem, corrupção e, de vez em quando, à prova daquela falência sistémica da praxe. Cavaco só prolongou o mesmo tipo de deslumbramento impante que inicialmente a Europa parecia proporcionar à nossa classe política cada vez mais arrivista e de 3.ª categoria, a começar por Soares.
Reconheço, hoje, que o despojamento e escondimento intelectualmente póstumos de Cunhal tiveram infinitamente mais dignidade que o ostensivo engordar de bolso e de vida de Soares: num País normal não deveria ser normal enriquecer assim, tão mal-explicadamente. Também admito que tenho sentida inveja do aparente calor humano e sentido de ética e ordem dos militantes comunistas, embora demasiado ortodoxos na conservação da fé, na punição persecutória dos hereges ou corpos estranhos.
Resulta, pois, que Mestre Cunhal embora mais rígido e mais perigoso enquanto político foi, em quase tudo o mais, superior ao seu Discípulo Soares, que hoje definha entre o desbocamento completamente deslocado e a malícia impostora das Esquerdas que visa federar e não federa, por mais que tente. Cunhal, estando morto, dá-nos paz, uma completa paz entre as ossadas apaziguadas da utopia e o cadáver adiado do totalitarismo.
Pelo contrário, Soares, ávido fóssil da falecida retórica ideológica e do sectarismo mais tresloucado, não. Com aquela idade, está-se nas tintas: permite-se dizer o que lhe apetece e conspira a céu aberto contra o interesse nacional, baixando o nível, desumanizando os membros do Governo, manipulando Seguro ou apoucando-o publicamente, utilizando um vocabulário latrinário para tratar de coisas sérias. Perdeu todo o respeito por si mesmo. Perdeu o respeito por nós. Perdeu o respeito por Portugal. Perdido por cem, perdido por mil, quer ir-se numa fulgurante fogueira de vaidade lá, onde Cunhal deslizou rumo à irmã morte silente como um santo laico que, provavelmente, até era.
Tinha eu quatro anos quando, pela TV, e no ano da Revolução, o vi e ouvi pela primeira vez. A sua efígie terrífica causava-me medo. Aquela voz fina e salazaresca, aquele cenho fechado e esfíngico, formavam como que um todo, o qual em espelho, não passava de uma contraversão, pelo menos na concha corpórea, do velho ditador. Até à morte de Sá Carneiro, aterrorizava-me a ideia de suportar aquela hirta e hirsuta figura, incapaz de um sorriso, à frente dos destinos do meu País, coisa que sabiamente o nosso eleitorado soube evitar, embora, no período revolucionário, muito dano e abuso se tenham esparzido no País.
Infelizmente, apesar de Cunhal, Soares teve todo o tempo do mundo, na sombra ou às claras, para tratar da sua vidinha, cevar-se de todos os modos possíveis com o pão de ló dos recursos nacionais, dos financiamentos partidários internacionais, e a manha de empatar um Estado limpo, próspero, à prova de gatunagem, corrupção e, de vez em quando, à prova daquela falência sistémica da praxe. Cavaco só prolongou o mesmo tipo de deslumbramento impante que inicialmente a Europa parecia proporcionar à nossa classe política cada vez mais arrivista e de 3.ª categoria, a começar por Soares.
Reconheço, hoje, que o despojamento e escondimento intelectualmente póstumos de Cunhal tiveram infinitamente mais dignidade que o ostensivo engordar de bolso e de vida de Soares: num País normal não deveria ser normal enriquecer assim, tão mal-explicadamente. Também admito que tenho sentida inveja do aparente calor humano e sentido de ética e ordem dos militantes comunistas, embora demasiado ortodoxos na conservação da fé, na punição persecutória dos hereges ou corpos estranhos.
Resulta, pois, que Mestre Cunhal embora mais rígido e mais perigoso enquanto político foi, em quase tudo o mais, superior ao seu Discípulo Soares, que hoje definha entre o desbocamento completamente deslocado e a malícia impostora das Esquerdas que visa federar e não federa, por mais que tente. Cunhal, estando morto, dá-nos paz, uma completa paz entre as ossadas apaziguadas da utopia e o cadáver adiado do totalitarismo.
Pelo contrário, Soares, ávido fóssil da falecida retórica ideológica e do sectarismo mais tresloucado, não. Com aquela idade, está-se nas tintas: permite-se dizer o que lhe apetece e conspira a céu aberto contra o interesse nacional, baixando o nível, desumanizando os membros do Governo, manipulando Seguro ou apoucando-o publicamente, utilizando um vocabulário latrinário para tratar de coisas sérias. Perdeu todo o respeito por si mesmo. Perdeu o respeito por nós. Perdeu o respeito por Portugal. Perdido por cem, perdido por mil, quer ir-se numa fulgurante fogueira de vaidade lá, onde Cunhal deslizou rumo à irmã morte silente como um santo laico que, provavelmente, até era.
Comments
Este Homem foi fiel e dedicado aos seus princípios até à sua morte! Fará verdadeiramente parte da História de Portugal.
Será sempre recordado ao longo dos tempos.
Para além disso nunca foi verdadeiramente "O Responsável" pela situação a que a nossa Pátria chegou. Esses, sabemos bem quem são. Felizmente não farão estória.
Os Portugueses apenas se recordarão "desses seres" como os que, durante quase trinta anos, os mais mal trataram!