QUINTA-FEIRA, DIA DE SNIFAR DANIEL DEUSDADO

Preciso de esperança, no meio do triunfo dos filhos da puta e do meu e de milhares inexorável empobrecer. Preciso de acreditar no País heróico do Daniel Deusdado. Todas as quintas aguardo por ler estas verdades encorajantes, pois estou a ficar rouco com tanto roubo protegido pela puta-que-a-pariu-Procuradoria: «Não estou optimista sobre Portugal por achar que os tempos vão ser fáceis. Acho é que sabemos fazer das tripas coração e somos capazes de inventar uma saída onde não há saída. Nas últimas entrevistas que tenho tido a oportunidade de fazer com esses novos descobridores portugueses - os exportadores - encontro pontos em comum extraordinários: capacidade de contornar as tempestades negociais, resposta em tempo útil a pedidos diferenciados, humildade para fazerem pequenas vendas sabendo que todas juntas hão de dar um bolo grande - e um traço cada vez mais importante: a detecção de portugueses que trabalham em grandes empresas internacionais. Ajudam-nos a fazer a ponte com a língua e culturas locais, explicam o que precisamos de fazer e estabelecem relações de confiança do outro lado do negócio. Nos negócios a confiança é 90% e o preço apenas 10%. Estes portugueses são ouro.
A seguir vem o resto: qualidade nas coisas que fazemos, cada vez maior incorporação de design e tecnologia, novos produtos, projetos à medida, melhores respostas a prazos mais curtos, gestão de nível internacional, capacidade logística para entregar e, por fim, seriedade. Parece um mundo idílico - é verdade que nem todas as empresas exportadoras portuguesas são assim. Mas há muitas a cumprir estes patamares de altíssima exigência. No meio disto há muita gente humilde. Quando visito fábricas, encontro homens e mulheres presos a linhas de montagem muito duras para se trabalhar oito horas por dia. Há ruído, há poeiras, há gestos infinitamente mecânicos e repetidos, há uma corrida contra o tempo para se fazer mais e melhor. Por muito que tenham evoluído as fábricas, elas serão sempre um local algo hostil à fragilidade do ser humano. Olho para os operários, para as suas mãos, para a rotina no olhar e na postura, e vejo-os a levar o país às costas de manhã à noite sem ficarem na fotografia - e tantas vezes por 600 euros ou menos. Com a certeza que, muitos deles, para viverem melhor, chegam a casa e vão para a horta trabalhar. É o seu mundo, a sua defesa contra o tempo da escassez. Há outra questão central: como se descobrem mais oportunidades para exportar? É aqui que se joga a nossa sobrevivência. Há gente que arriscou tudo e se tornou global (Sonae, Amorim, etc....); gente que investiu muito e perdeu tudo (Aerosoles, por exemplo); pequenas empresas que brilham nos seus nichos (Onofre, Frezite, Adira, Miguel Vieira e tantas outras, para falar apenas de algumas que o JN tem trazido nas suas páginas). Falem com estes empresários: trabalham para ter duas casas ou um carro topo de gama? Dinheiro no banco para a reforma? A maioria deles já conseguiu isso, e ainda bem. Agora estão ao leme desta luta por questões de honra e brio: por si e pelos seus trabalhadores. Uma responsabilidade social também pelo país. Uma vontade de dizer que Portugal faz bem e é capaz, apesar da servidão fiscal. Apesar dos sucessivos governos terem cavado esta indignidade que nos desvaloriza aos olhos do mundo - o rating "lixo". Por isso mesmo temos de fazer tudo para não sermos expulsos do euro. O mundo não acaba, mas seria como começar de novo, muito do fundo, para voltarmos a ter 'marca europeia' e moeda estável. O milagre das nossas exportações não está apenas na qualidade e no preço mas está também no standard europeu que ninguém questiona: fazemos parte do melhor clube do mundo - a Europa. É isto que nos alavanca sobretudo nas vendas para fora da União Europeia. Regresso às fábricas: às linhas onde costureiras cosem sem fim, agarradas às máquinas; onde os metalúrgicos soldam e concretizam engenharia de ponta; onde se carrega grés para fazer cerâmica; ou aos campos de Trás-os-Montes onde se cuidam das oliveiras para fazer dos melhores azeites do Mundo; às Beiras onde se apanham as cerejas à mão ou às vindimas do Douro. Por favor: deixem esta gente trabalhar. Não repitam todos os dias que o país não tem futuro. Dependemos deles. E eles estão a fazer bem a sua missão e vão tirar-nos deste buraco.» Daniel Deusdado

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