CONTAS PARA CATADORES DE FASCISTAS
Eu sei que o Primeiro-Ministro é fraquinho e teimoso. Eu sei. Mas a divindade faz milagres colectivos com os mais incompetentes e incapazes, com os mais covardes e estouvados, menos com os competentes e repletos de si, porque o paradoxo da realização espiritual ocorre na precisa auto-anulação e no fracasso pessoais à luz dos critérios-selva dos humanos, o ápice da realização espiritual dá-se na descida ao âmago de nós mesmos pelo inferno da derrota, pela entrega de si nas mãos do Alto, cônscios da nossa cintilante miséria no plano mais vasto de um Cosmos, provavelmente mais um grão de pó entre os Multiversos, mas em que cada coração é maior que a soma de cada um deles-Cosmos. Só mesmo o pós-morte para premiar e dar sentido absolutos a uma vida nascida e morta no lixo de Manila, nascida e morta nas minas diamantíferas de África, nascida e atolada no pântano da Incúria como é Portugal. Uma vida pessoal ou colectiva fracassada ainda beneficia da larga promessa das Bem-Aventuranças. Alguém tape a boca ao beato que aqui posta e assassine o fascista que há em mim, se há alguém no blogue que lê o blogue, como diria um leitor fora-de-si.
Ora, portantos, Passos é fraquinho. O que se evidencia em Passos, evidencia-se muito mais no Povo Português, um Povo que é igualzinho a Passos ou até menos que Passos, naquela acepção espiritual que acabei de expor. Por exemplo, quem matou as expectativas crescimentistas para 2014? Passos! O Povo Português fará o resto. Este era para ser o ano do nosso apuro enquanto Povo tutelado pelo BCE, com uma abóbora na Presidência da República, um pepino como líder do Principal Partido da Oposição, além de uma série de grelos e de nabos na chefia de um sindicalismo instalado e obeso, com bigode e vasto ventre. Portanto, olhe-se para Passos e pense-se em milhões de Passos, milhões de Arménios e milhões de Ferreira Leite, Seguros ou Jerónimos, em sã desharmonia, consumindo produtos estritamente nacionais e procurando soluções inteligentes para fazer face ao empobrecimento galopante da nossa sociedade. Não se pensa? Porquê? Porque todos são fraquinhos, teimosos, medíocres. Nabos.
A retoma da economia, graças a Passos e graças ao Esquerdismo Pessimista e graças a todos os lambisgóias da opinião, poderá ser mais um flop, com retracção no consumo das famílias e no investimento privado. Soluções? Nova rebelião murcha em frente ao Parlamento? Claro que não. Crescimento económico, investimento privado massivo contra tudo e contra todos. Passos, como digo, é fraquinho e limitado tal como Seguro, Jerónimo, Semedo, todos nabos, todos grelos. Ainda bem, dirá o BCE. Medidas como o corte nas pensões ou nos salários vão fazer-nos tremer por antecipação até ao dia da sua entrada em vigor, antes de, muito depois, o Tribunal Constitucional voltar a intervir, declarando que há dinheiro para fazer tudo ao contrário do que o Governo e o BCE-Troyka determinaram. País-comédia que faz chorar e rir!
Passos, Passos e Passos! Sim, concentremos em Passos todas as queixas que poderíamos distribuir pelo padeiro, a florista e o homem que escarra na rua e leva o cão a cagar no espaço reservado a peões: o homem não sabe ser claro, directo, transparente, sério e verdadeiro, coitado. Muitos portugueses, se pudessem viver de expedientes e chegar à ponta de um Dias Loureiro, não perderia a oportunidade. Passos poderia dizer-nos que 2014 nos aterrorizará, que sentiremos que o pior ainda nem sequer começou, mas prefere aquela conversa redonda e perifrástica, olhos nos olhos, na RTP, enquanto vemos nada ser feito nos crimes graves do passado, nada atalhar as corrupções e roubos descarados aos contribuintes. E Machete, o Pachá-Nababo da Direita, que não há maneira que se vá. Sintomático, não?!
Não é a falar genericamente do corte nas pensões de sobrevivência, meus caros profissionais apodadores de fascistas, que contribuiremos para separar o trigo do joio, em Portugal. Chateia-me que a esquerdalhada bem como a manuela-ferreira-leitada não trate esta questão, e outras, por segmentos. Chateia-me que se fale desta medida como violadora da matriz social-democrata, escamoteando um conjunto de dados que configuram Portugal como um Estado muito longe da justa distribuição de sacrifícios. Estamos todos muito incomodados com esta medida, mas as contas do FMI são implacáveis quando anunciam a necessidade de financiamento do Estado em 72,5 mil milhões de euros, para 2014 e 2015: Portugal tem que se financiar em 22,1% do PIB no próximo ano e em 20,5% do PIB em 2015 para amortizar a dívida que vence nesses dois anos e pagar os défices orçamentais: são estas as necessidades de financiamento anuais e é este o volume de dívida bruta.
Temos, portanto, um problema sério para cuja debelação todos na vida pública nacional se mostram fraquinhos, teimosos, demagogos e covardes. Com um Passos Coelho à medida de milhões de passos-coelhos e um Arménio ou um Seguro replicados por milhões de seguros e de arménios. Todos muito fraquinhos, muito teimosos, muito aluados. E muito friamente do que precisamos é de crescimento económico e de taxas de juro favoráveis. Nem de marchas. Nem de manifs. Nem de Tribunais Constitucionais a detonar esta urgência de paz com os mercados.
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Que povo labrego. Tudo chafurda.