NÃO FICAR PARA TRÁS, DEVER NACIONAL



Pois, João Paulo, a nossa fome não é, de facto, um dever constitucional, mas por exemplo o fim das subvenções de ex-políticos, actuais políticos, como Cavaco, Assunção Esteves e Catroga, e futuros políticos, a esta luz, torna-se um dever imediato da legislatura e outros movimentos similares autorreformistas do Sistema tornam-se imperativos precisamente perante a penúria, a fome e a nudez de muitos portugueses apanhados no tsunami deste ajustamento. Não deverias partir do pressuposto de que acato acriticamente a papa regurgitada pelo Governo Passos Coelho II ou papo com cara de tolo todas as desculpas para o agravamento da factura social para suster a factura do défice: também eu fui posto a pão e água pela Troyka e por Passos e se me rebelo, rebelo-me, sim, cumulativamente contra o passado culpado e contra a covardia e incompetência que são as do Governo, mas também em larguíssima medida da Oposição liderada pelo Partido Chupcialista. Não deverias cavar a trincheira das nossas distintas razões por finalidades comuns colocando-me no lado sádico da questão e ficando tu com o lado monopolista do bom senso e da sensibilidade e do sentido social. A Esquerda farta-se de estigmatizar outros redutos desapossando-os de humanidade e de boas intenções, pelo menos tão boas quanto as deles: concordarás comigo que se o Aparelho de Estado foi colonizado pelos partidos com camadas e camadas de clientes, há-de ser uma magna tarefa desparasitá-lo e é por isso que Soares reincide em apelar ao motim, à balbúrdia, à queda fragorosa de todos os esforços por mudar o paradigma parasitário segregado no pós-Abril. Há limites, João, para esse absolutismo da razão e para a superioridade moral das Esquerdas, chão que deu uvas, sobretudo muito dinheirinho a ganhar aos que na Oposição se couraçam de Esquerda até aos dentes mas depois, uma vez Governos Chupcialistas, seguem os trilhos e as linhas previamente cerzidas do Capitalismo interno e externo, servindo exclusivamente os senhores do Dinheiro. Menos, João Paulo. Menos fervor, por favor… Olho para quinze de Outubro de 2014, dia da Apresentação do OE 2014, como, afinal, a data da verdade. Não se pode discordar dos que, como tu, baptizam este Orçamento de criminoso. Claro que é criminoso. Mas trata-se de um crime que visa salvar, que opera segundo o princípio do mal o menos. Um crime o qual, à luz do que se sabe acerca das lógicas insensíveis dos credores, mitigará males intoleravelmente maiores às suas mãos. As linhas de força do OE para 2014 mostram claramente que primeiro e acima de qualquer outro desígnio impera a procura dos mais adequados sinais internos que conduzam à baixa das taxas de juro para a dívida pública nos diversos prazos. A única estratégia parece ser essa, a de gerar imediata confiança nos credores para que sosseguem o preço incomportável do dinheiro com que o Estado Português poderá, já em Julho, financiar-se normalmente. O Governo pode ser acusado de tudo o que é tipicamente português, pode passar por calculista, temeroso, erróneo, na temporização e no gizar das medidas, mas o certo é que nenhum outro teve por sistema tão más e tão duras notícias para nos dar, arriscando queimar-se como nenhum outro. Porquê? Porque a mentira foi quem mais ordenou bem como as necessidades eleitorais. Andaram a mentir-nos, só pode. E a chamar nomes feios a Medina Carreira. Quem ouvisse qualquer outro Governo em qualquer outro ponto temporal, diria que tudo andava pelo máximo dos melhores mundos possíveis. Hoje, o nosso fado é o da fadiga, apesar de haver um recobrar de forças na iniciativa privada e aquele tipo de sinais positivos que só pecam pela fragilidade e a escala ainda incipiente. O défice para 2014 é o nosso Cabo Tormentoso. Défice representa dívida. Menos défice representa menos necessidade de financiamento do Estado Português para atacar antes de mais o stock acumulado dela. Estamos no âmbito do Euro e no âmbito dos Credores Externos, impedidos de contrair mais e a meta dos 4% é tudo quanto de draconiano devemos entestar. Onde houver dinheiro, o Governo está aí para extorqui-lo. Apanham os aposentados da Função Pública. Apanham os reformados da Segurança Social. Não se sabe se pensionistas futuros poderão aspirar a qualquer coisa, quaisquer direitos, ao nível do que hoje vigora. A colecta é dura, mas é o que é. Funcionários públicos constatam que nenhuma zona de conformo se mostra mais desconfortável que a sua e a confrontação que se pondera, já pondera os prós e contras para avançar: parar o País e obter o quê, inverter que coisa? A mera substituição de uns cobradores amanuenses secos e duros por outros cobradores amanuenses simpáticos, sensíveis e melífluos, atados de pés e mãos? É essa a tua falácia, enquanto militante, presumo, do Partido Chupcialista: querem mudar tudo para que tudo fique ainda pior, na perda de tempo e no fingimento de alternativas. Nós, os talentosos desperdiçados, os despojos da dívida, da crise e do ajustamente, nós, os desempregados, vemos bem a negrura do túnel sem lâmpada ou luz final e é mais natural pensar em sair o mais rápido possível para lavar latrinas na Europa sem Falências por Corrupção de Estado, do que permanecer encostados às cordas da desesperação e da miséria mais que certa. Por exemplo, a Lei n.º 51/2013, de 24 de Julho aplicará uma taxa de 6% ao meu subsídio já penhorado pelo BES fazendo-me receber duzentos e oitenta e poucos euros para me alimentar a mim, à mulher e a duas filhas, com cobrança retroactiva de 83,12 euros relativa aos meses de Setembro, Agosto e Julho. É a barbárie, concedo. Estou, estamos cercados de não-emprego e do convite ao suicídio por nos falhar, neste mínimo, o Estado. Não consigo conceber pior tragédia. E no entanto, não posso penalizar em exclusivo este Executivo. Se se sufoca, há uma lógica sem sentimentos por detrás que pode mais que a nossa dor e as nossas queixas. Para cumprir um défice, temos razia social e mais doses cavalares de privações, depressões, recessões pessoais e familiares. Mas uma das coisas mais promissoras e que mais me repletou de confiança e de esperança em 2013 foi ver a quantidade avassaladora de turistas que procuraram o nosso País. No Porto e em Gaia. Nas cidades do Minho que deliciosamente visitei, Braga, Guimarães, Viana do Castelo, Ponte de Lima. Nem nos meus sonhos mais loucos de intensa mobilidade interna europeia, de um turismo geriátrico europeu, sonhei ser possível na maior parte dos meses do ano, não somente em dias de sol e temperatura amena, um tal volume de consumidores efectivos em trânsito pelo nosso País. Isso e haver quem, na Europa e no Mundo, nos compre mais e solicite mais o que temos. Não há outro caminho senão, do fundo deste espezinhamento do Portugal devedor endividado, do Portugal evadido fiscal, e abissalmente cindido entre os que têm e os que nada têm, senão que qualquer coisa de bom possa emergir. Apesar de tudo. Cumprir o Motim Onanista do Dr. Soares é criar entropia nos sinais de esperança e é afugentar públicos, consumidores, amantes estrangeiros de Portugal. É preciso lutar, mas com nenhuma arma mesquinha que passe por turbulência paralisadora do País. Temos de acreditar. Preciso de acreditar antes de me fazer a uma Índia e a um Oriente onde me esconda, esquecendo finalmente a grande e fragorosa Queda de Portugal, entre o azar de melindrar o Regime Angolano, aliás “exemplar” no concerto do Mundo, e não ter ninguém verdadeiramente por nós que nos colocámos nesta situação. Tirando o caso islandês, se a falência dos Países é um fenómeno mais ou menos associado à Corrupção de Estado, a falência de Portugal por três vezes em quarenta anos democratóides foi certamente um caso de Corrupção de Estado mas repleto de requinte e abrangendo um vasto leque de responsáveis, entre políticos venais, jornalismo e opinião encartada venais, elites sôfregas, e anos com uma riqueza assimetricamente distribuída. 2013 passou quase. Venha esse calvário de 2014. Não há-de ser nada.

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