RECEPÇÃO E FORTUNA LITERÁRIAS
Eu gosto muito de mim, de me ler. Sou irresistível — literariamente, como é óbvio —, para mim mesmo. Sena irresistível para ele. Tu para ti. Vasco Pulido para ele mesmo. O Emplastro para o Emplastro. Etc., etc..
Não quer dizer que, no fundo, para muitos, eu não passe de uma Merda, entre outras Merdas com mais ou menos lustro.
É assim e não passa disto. A Teoria da Recepção Literária não é teoria nenhuma. Há tantos e tantas que nem compreendem por que outras tantas e outros tantos gostam deles. Wolfgang Iser assegurava que «o texto literário é um acto intencional dirigido a um certo mundo,
o mundo com que ele se relaciona não é repetido, mas experimenta
ajustes e colecções (...). A função do texto literário funda-se, portanto, nas maneiras de fazer um balanço de um mundo
problemático ou por ele problematizado.» Isso não se faz nas lógicas de efémero de que e para que vivemos, bloggers ou para-literatos. O gosto que motiva, por exemplo, os usuários do YouTube a fazer explodir um dado vídeo não é propriamente um gosto, mas um gesto, um impulso viral, que actua pela inércia da divulgação consumista e nada mais. A cria de gato abraçada pela mãe, o que se quiser, não passam de supernovas do efémero. Mérito e sorte? Ambos? Nenhum dos dois? Regina Zilberman escreve sintomaticamente: «Oferecer a estética da recepção como um novo figurino ou
esperar que ela encontre seguidores e adeptos de alguma outra
corrente critica ou filosófica, é não apenas ter uma visão frívola da
teoria da literatura (...), significa também colaborar para a
alienação e dependência culturais, de que aquela frivolidade é um
dos sintomas.» Sena tinha um problema: a finitude. A finitude obriga-nos a julgar por estimativa. Dita ela que nos limitemos forçosamente na fruição limitada de quanto belo, sensório, ou intelectualmente estimulante existe sob os céus.
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