ESPANHA E FOME BRANCA PORTUGUESA

Quatro milhões de espanhóis desempregados é uma hecatombe. Em Portugal, não há alarme entre os governamentais, antes parecem ter todo o tempo do mundo. E por cá, se as ruas portuguesas não transbordam como as espanholas ou francesas é porque a fome vai sendo branca. Ainda não é negra. O que é a fome branca? Pão com pão, puré de pão, empada de pão, pão com todos, salada de pão, sopa de pão, pão de pãozinho e molete biju. Não somos menos que os demais habitantes da Península nos impactos do desemprego e se ainda não enchemos as ruas de indignação e protesto veemente isso é porque o desespero gregário dos outros povos e indignada intolerância gregária contra um estado de coisas deplorável transforma-se na timidez individualista portuguesa e na tímida e discreta reacção entredentes do povo português, exímio murmurador. Quarenta anos de ditadura e mais de cem de emigração continuada para o mundo mais próspero fizeram do português um desenrascado e independente cidadão ensimesmado do Planeta, mas também doméstica e domesticadamente numa rês dócil ao jugo mais pesado, rã viva posta a cozer no seu País sem se dar conta. A vampírica República corrupta e clientelar portuguesa que nos tutela transformou-se no caldeirão de gradativa ebulição onde os portugueses, sem se darem conta, serão cozidos até à morte, à dissolução, ao desaparecimento. Espanhóis e Franceses, esses, de olho aberto e espírito crítico, esperneiam a tempo para fora da panela armadilhada. E são largos milhões de irritados excluídos: «No final do primeiro trimestre deste ano, o desemprego em Espanha ultrapassou a fasquia psicológica de quatro milhões de pessoas. De acordo com os dados do Inquérito de População Activa, hoje divulgados em Madrid, o número de desempregados espanhóis atingiu, em finais de Março, 4.010.700, equivalente a 17,3 por cento da população activa, o valor mais alto da última década.»