DANKE, FRAU LEMKE!
É alemã. Nunca me viu nem me julga. Também tem duas filhinhas pequenas.
Simplesmente ouviu-me e soube agir no dia 31 de Dezembro: deu-me um Peixe.
Sabe perfeitamente que eu sei pescar, mas sabe também
que pescar hoje é algo genericamente sonegado a milhões de pessoas:
os investidores preferiram perder milhões na especulação de alto risco,
na esperança de poder ganhar outro tanto rapidamente. Trabalho digno rareia.
Sem a paciência do Semeador, pensam desumanos:
«As máquinas fazem tudo e o Magalhães supre o 'professorzeco',
para que precisamos de empregar gente?
Vamos antes esmagá-los de humilhações e desânimo
e aliviar a despesa para fazer TGVs e para pagar balúrdios às nossas fiéis clientelas.
Sim, vamos fanar, surripiar, roubar, furtar, chupar, engolir, sacar, palmar Portugal».
lkj
De repente, descobrem-se keynesianos, mas só porque é ano de eleições.
Frau Lemke sabe que tenho todo direito a negar-me a pescar
quando a iniquidade, a injustiça, a mentira triunfam e subvertem o meu País.
Não foi a única a dar-me um Peixe. O meu amigo Abel, da mesma luta em bloga,
e um cidadão que não me parece conhecer chamado João, a dado momento,
fizeram a mesma coisa. Deram-me cada um Peixe.
Mas ela fê-lo, apesar da distância, da ininteligibilidade do Português
neste blogue para ela, fê-lo apesar do quase anonimato da minha passagem.
Ela fê-lo, ousou, e foi a única em talvez mais quinze mil tentativas
de pedidos por um pequeno e irrisório Peixe.
lkj
Por isso mesmo, Frau Lemke não pode ser uma mulher qualquer.
Frau Lemke tem de ser muito especial.
Frau Lemke gostou do meu inglês cuidado.
Frau Lemke é doravante para mim o sabor de um Anjo
que não me ensina a pescar,
que não me faz sermões moralóides de como pescar,
um Anjo que não se preocupa somente imensamente comigo e que eu pesque e repesque,
mas que afinal dorme tranquilo todas a noites. Não.
Frau Lemke simplesmente deu-me, verbo que mal sobrevive!, um pequeno Peixe.
E isso significou para mim o gesto daquela Fraternidade Essencial
de que continuo à procura, coisa que rareia e cuja falta Dói.
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